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domingo, outubro 26, 2003

A Convenção Autárquica do PS foi um enorme êxito, principalmente em termos políticos. Produziram-se novas ideias e relançou-se um grupo de pessoas dispostas a trabalhar e lutar para que Estarreja volte a ser um concelho pelo menos tão forte, dinâmico e relevante como o era há bem pouco tempo. O deputado Afonso Candal foi o único representante do partido a vir de fora de Estarreja, e teve uma intervenção muito bem construída e inteligente, que surpreendeu quase todos.
Eu falei do Parque Industrial. Eis o conteúdo do meu discurso:
O plano estratégico do concelho de Estarreja, aprovado em 2001 pela Câmara e pela Assembleia Municipal, apontava o crescimento industrial como a solução principal para o desenvolvimento do nosso concelho. Nesse contexto, o Parque Eco-Industrial, cuja edificação estava a ser preparada pelo anterior executivo camarário, assumia um papel central e agregador em todo o processo. O parque seria construído de acordo com as mais modernas normas de convivência com o ambiente, segundo o modelo do Parque Eco-Industrial de Kalundborg, na Dinamarca, o primeiro e mais avançado parque do mundo a funcionar de acordo com o conceito de desenvolvimento sustentado, em que o respeito pelos recursos existentes é a palavra de ordem, de modo a que as gerações vindouras não venham a sofrer as consequências de um comportamento excessivamente gastador por parte dos que hoje habitam o nosso planeta.
No Parque Eco-Industrial planeado para Estarreja, tal como no de Kalundborg, a ecologia é a preocupação central de todas as empresas, que por este facto não vêm os seus resultados financeiros prejudicados. Aliás, antes pelo contrário: aspectos como a reciclagem e reaproveitamento de recursos, o uso de energia solar ou a minimização dos custos de tratamento de resíduos podem constituir importantes ganhos financeiros para as empresas que os respeitem. O projecto do Parque Eco-Industrial que o PS estava a construir previa ainda a integração da indústria com a própria sociedade: o parque teria zonas arborizadas, de lazer e áreas para a prática de desporto, que funcionariam harmoniosamente segundo um modelo que, embora até possa parecer utópico, não o é, pois existe e está implementado noutros países. O parque teria um regulamento próprio, com o qual as empresas que se pretendessem instalar no nosso parque teriam de se comprometer, e Estarreja passaria a ser um concelho conhecido não só pela excelência do seu desenvolvimento industrial, mas também pelos elevados padrões de respeito pelo meio ambiente, desenvolvimento sustentável e integração entre a indústria e sociedade em que esta se insere. O nosso Parque Eco-Industrial seria naturalmente uma importante referência a nível nacional e até europeu, e uma empresa que se instalasse em Estarreja estaria imediatamente a passar para o mercado uma imagem de qualidade e respeito pelo ambiente absolutamente credível e, porque não dizê-lo, rentável. Eu sei que esta descrição corre o risco de se assemelhar mais a uma versão estarrejense do discurso do sonho de Martin Luther King do que propriamente a uma recordação de projectos que ainda há dois anos eram bem reais e perfeitamente possíveis. No entanto, a verdade é esta, e aqueles que acompanharam de perto este processo conhecem-na perfeitamente, pois este foi sempre público e publicitado, ao contrário do que agora sucede.
O anterior executivo camarário havia já assegurado a comparticipação estatal para a edificação do Parque Eco-Industrial de Estarreja. O concurso público internacional para esta obra foi ganho pela empresa Mota e Companhia, que posteriormente até se comprometeu a concluir a obra no espaço de um ano e meio. Ou seja, o nosso parque estaria concluído no Verão de 2003... No projecto que estava a ser preparado, a Câmara Municipal de Estarreja seria sempre maioritária na entidade gestora do parque, em cuja administração também haveria provavelmente lugar para a Universidade de Aveiro e associações industriais da nossa região, como a SEMA ou a AIDA. Embora esta estruturação do poder não estivesse ainda completamente definida e aprovada pela Câmara e Assembleia Municipal, era ponto assente que a Câmara Municipal de Estarreja seria sempre maioritária (com mais de 50% dos votos) na administração do futuro parque. Ou seja, todas as decisões que afectassem aquela empresa teriam que ter a concordância expressa da Câmara Municipal de Estarreja. Este é, talvez, o ponto mais importante de toda esta questão, pois o que era uma questão de honra no tempo do PS passou a ser um pormenor secreto e ainda não esclarecido pelo actual executivo camarário, apesar de toda a insistência da oposição e até da comunicação social.
Quando o Dr. José Eduardo de Matos e a sua equipa chegaram ao poder, em Dezembro de 2001, uma das suas primeiras medidas foi suspender todo o processo de construção do Parque Eco-Industrial de Estarreja. Em Janeiro, as obras pararam. Argumentava-se que o parque era “megalómano” e excessivamente grande para as necessidades de Estarreja. Dizia-se também que não havia dinheiro para construir o Parque, pois este era demasiado caro para as possibilidades económicas do nosso concelho. Perante estas acusações, o anterior Presidente da Câmara Municipal de Estarreja reafirmou, perante a Assembleia Municipal, que o financiamento para a construção do parque estava assegurado e mostrou-se inteiramente disponível para explicar aos novos autarcas como é que eles poderiam conseguir que o estado pagasse esta obra fundamental para o desenvolvimento do nosso concelho. A proposta foi ignorada.
Em Fevereiro de 2002 realizou-se uma Assembleia Municipal extraordinária dedicada ao tema do Parque Industrial, em que foram apresentadas diversas propostas, algumas das quais até relativamente interessantes. O Dr. Carlos Tavares, actual Ministro da Economia, foi um dos parlamentares que mais ideias trouxe para o debate. No final dessa reunião, o Sr. Presidente da Câmara mostrou-se satisfeito com os resultados obtidos e disse que o executivo camarário iria analisar o assunto, não se comprometendo, contudo, com nenhuma das soluções apresentadas. Da referida Assembleia Municipal, apenas ficara a intenção da Câmara Municipal construir o parque em fases, a primeira das quais ficaria pronta em “cerca de seis meses”. Esta foi a última vez que a Assembleia Municipal de Estarreja foi informada sobre os factos relativos ao processo do Parque Industrial.
Pouco tempo depois da reunião atrás referida, a CME anunciou a criação de uma comissão cujo objectivo seria supostamente estudar a melhor forma de construir e gerir um Parque Industrial em Estarreja. A comissão tinha uma composição “sui generis”: para além da CME, faziam parte deste grupo também o IPE e a Quimiparque. Ora, é importante que nos recordemos que estávamos num momento em que o PSD anunciava aos quatro ventos a sua intenção de “desmantelar” o IPE, e que a Quimiparque era detida, em 100% do seu capital, por aquele defunto instituto público. A constituição desta comissão era, logo à partida, um risco perfeitamente despropositado e até um pouco insólito. O único relatório que esta comissão produziu tem já cerca de 1 ano e meio e nunca foi apresentado à Assembleia Municipal. Aliás, nem sequer se sabe se a referida comissão ainda existe, ou o que é que aconteceu aos seus elementos, agora que o IPE foi dissolvido, curiosamente pelo ministério coordenado pelo Dr. Carlos Tavares. No referido documento não são esclarecidas nenhuma das questões fundamentais sobre esta matéria, que insistentemente têm vindo a ser levantadas, vezes sem conta, pela nossa bancada na Assembleia Municipal. Em Julho deste ano, o nosso grupo parlamentar apresentou à Câmara Municipal um requerimento, para o qual ainda não tivemos qualquer resposta, em que colocávamos algumas questões, absolutamente legítimas e essenciais sobre esta matéria, e que focavam os seguintes aspectos:
- Informação e acesso a toda a documentação sobre o processo de construção e acompanhamento do futuro Parque Industrial de Estarreja, incluindo cópia do contrato celebrado com a empresa construtora;
- Acesso ao relatório completo da comissão, pois apenas foram tornadas públicas algumas páginas de um documento bastante mais extenso;
- Informação sobre aspectos relacionados com os custos e mapas de execução das obras;
- Informação sobre a constituição da futura sociedade gestora do Parque Industrial e o contributo e importância relativa de cada um dos parceiros na empresa. Neste momento apenas sabemos que quem está a pagar a aquisição dos terrenos e a respectiva construção de infra-estruturas é a CME. Nada se sabe sobre eventuais contribuições de outros sócios, até porque também não se sabe quem é que eles são, ou sequer se existem;
- Outro dos aspectos que nos parece fundamental é o do acompanhamento do funcionamento do Parque. Sabemos que não faltam exemplos de falhanços em parcerias deste género devido a problemas relacionados com a assimetria de informação que inevitavelmente existe entre as diversas partes da sociedade. Só não sabemos é como é que a CME pensa resolver este problema.
O atraso das obras do Parque Industrial é outro dos factores que nos preocupa. Longe vão os tempos em que se falava nos tais 6 meses para a conclusão da primeira fase e se anunciava nos boletins municipais a instalação das primeiras empresas no Parque para o ano de 2003. Aliás, o próprio orçamento municipal para o corrente ano previa receitas de vendas de terrenos superiores a 2 milhões de euros!
A vertente ecológica do Parque Industrial parece estar também a ser descurada: há relatos de cortes de árvores e extracções de areias perfeitamente anárquicos, que apenas servem para demonstrar que não existe qualquer regulamento que salvaguarde os aspectos ambientais de um Parque em que a palavra Eco apenas serve para fazer eco.
Sobre o financiamento da construção do Parque Industrial, a pouca informação que existe também não é animadora. Ao que parece, o parque está a ser edificado sem qualquer comparticipação estatal ou da UE. O facto do Ministro da Economia ser um dos ideólogos do actual modelo de Parque Industrial e do PSD de Estarreja até possuir nas suas fileiras uma deputada no Parlamento Europeu não foi suficiente para conseguir atrair verbas do terceiro quadro comunitário de apoio para este projecto. É que nós nem sequer estamos a pedir favor nenhum: o Parque Eco-Industrial de Estarreja é uma obra de interesse nacional, dinamizadora da economia e altamente geradora de empregos, absolutamente essencial para um dos distritos mais afectados pelo desemprego. O alargamento da UE e o fim dos fundos comunitários em 2006 fazem com que se esteja a perder uma oportunidade única, o que terá gravíssimos prejuízos económicos para o concelho de Estarreja.
O anúncio do novo traçado do IC1 foi mais uma dupla machadada no futuro do Parque Eco-Industrial de Estarreja. Por um lado, perdeu-se o acesso directo desta via ao parque, ao contrário daquilo que desde sempre esteve projectado. Por outro lado, parece provável que um parque que deveria ser ecológico vá acabar por ser atravessado por uma auto-estrada, segundo um traçado perfeitamente absurdo e imoral, encomendado apenas à medida das necessidades eleitoralistas dos políticos do PSD.
O futuro do Parque Eco-Industrial de Estarreja parece ser negro, e infelizmente o desenvolvimento económico do nosso concelho estará sempre indissociado do êxito desta estrutura.
É por isso que este projecto era tão importante.
É por isso que temos que parar com o secretismo em torno deste processo e temos que voltar a envolver a Assembleia Municipal na discussão desta matéria.
É por isso que é absolutamente inadmissível que a CME não seja proprietária de mais de 50% do Parque.
Quando lutamos pelo Parque Eco-Industrial de Estarreja, é pelo futuro do nosso concelho que estamos a lutar!

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