terça-feira, dezembro 16, 2003
Caros leitores:
Depois de cerca de 15 dias de pausa por motivos profissionais e académicos, penso que irá ser possível voltar à actividade provocatória.
Começo por agradecer a todos os que, mesmo nestes 15 dias de interregno, continuaram a visitar o Estarreja Efervescente com alguma regularidade.
Neste período foram vários os acontecimentos relevantes, quer a nível internacional (principalmente), quer a nível local. Este primeiro post surge para recordar um texto que escrevi no dia 21 de Abril de 2002 e que foi publicado pelo Jornal de Estarreja alguns dias depois. É extremamente curioso recordá-lo agora, depois da lamentável cimeira de Genebra e dos tristes acontecimentos do incumprimento do PEC por parte da França e Alemanha:
O Aviso Francês
As democracias da União Europeia parecem estar acometidas de uma terrível doença, da qual desconhecem a causa e muito menos a cura. De facto, um pouco por toda a Europa vão surgindo pequenas borbulhas malcheirosas e extremamente incomodativas, que aos poucos vão marcando a sua presença, quase uma por cada país. Estes quistos de extrema-direita alastram onde menos seria de esperar. A última vítima foi a França, nação-berço dos Direitos Humanos, uma das mais importantes referências da construção europeia. A principal consequência imediata desta doença foi o fim da carreira política de Lionel Jospin, o mesmo político que algumas figuras da chamada "ala esquerda" do PS, como Mário Soares ou Manuel Alegre, tanto têm elogiado, graças à sua enorme "visão estratégica", que o fez aliar-se com o ortodoxo Partido Comunista Francês numa coligação governamental de "grande sucesso". Pois aí estão as consequências deste pretenso iluminismo ideológico: a segunda volta das presidenciais será disputada entre a tradicional direita gaullista e a extrema-direita, e às eleições francesas concorreram alguns dos espécimens mais retrógados e inimagináveis do jardim zoológico político em que a esquerda francesa se transformou. Como é possível que em 2002 ainda existam 3 candidatos trotskistas? Tudo isto tem, no entanto, consequências extremamente graves, não só para o PS francês, mas para a democracia em geral. Este tipo de irresponsabilidades ideológicas leva naturalmente ao surgimento de aberrações da democracia, como Le Pen, Haider ou Bossi, para citar só os mais conhecidos. Por tudo isto, o "caso francês" deve ser cuidadosamente analisado, para que entre nós os políticos do chamado bloco central não cometam os mesmos erros. Contudo, basta um rápido olhar sobre o que se passou em França para se perceberem algumas arrepiantes semelhanças entre o "caso francês" e a política portuguesa dos últimos tempos: Lionel Jospin foi a quarta escolha para o cargo de dirigente máximo do PS francês, ao passo que Ferro Rodrigues foi a terceira escolha para o correspondente cargo em Portugal, depois de António Vitorino e Jaime Gama. Por outro lado, é importante notar-se que nas últimas eleições legislativas o BE quase que duplicou a sua votação e que, pela primeira vez desde o 25 de Abril, tivemos um partido fascista a concorrer às eleições legislativas nacionais (o PNR). Tudo isto são sinais mais do que preocupantes da degradação progressiva do espectro político português, com os votos nos extremos a surgirem como forma de protesto contra o rumo que os políticos deram à política em Portugal. Depois da patetice alegre e assustadiça que foi o "guterrismo", será que vamos agora ter um "ferrismo" autista com ideologias há 10 anos fora do prazo? Quando é que o PS percebe que o seu lugar político é o centro e que quaisquer aproximações aos decrépitos cacos do Muro de Berlim apenas servem para o integrar na dinâmica de degradação que parece ter atingido a esquerda mundial? O Partido Trabalhista de Tony Blair e o Partido Democrata de Bill Clinton foram dois excelentes exemplos de como é possível conciliar as preocupações sociais com um liberalismo económico progressivo. Será que o aviso francês vai chegar a Portugal? Ou será que nos vamos todos embebedar com os 80% que Chirac vai ter na segunda volta das eleições, para a seguir aguardarmos com alegria a chegada do vírus ao nosso país?
Para os próximos dias prometo publicar as minhas opiniões sobre o triste orçamento-fósforo (depois explicarei esta analogia) que a CME propõe para 2003 e que será discutido pela AM na próxima 5ª feira.
Depois de cerca de 15 dias de pausa por motivos profissionais e académicos, penso que irá ser possível voltar à actividade provocatória.
Começo por agradecer a todos os que, mesmo nestes 15 dias de interregno, continuaram a visitar o Estarreja Efervescente com alguma regularidade.
Neste período foram vários os acontecimentos relevantes, quer a nível internacional (principalmente), quer a nível local. Este primeiro post surge para recordar um texto que escrevi no dia 21 de Abril de 2002 e que foi publicado pelo Jornal de Estarreja alguns dias depois. É extremamente curioso recordá-lo agora, depois da lamentável cimeira de Genebra e dos tristes acontecimentos do incumprimento do PEC por parte da França e Alemanha:
O Aviso Francês
As democracias da União Europeia parecem estar acometidas de uma terrível doença, da qual desconhecem a causa e muito menos a cura. De facto, um pouco por toda a Europa vão surgindo pequenas borbulhas malcheirosas e extremamente incomodativas, que aos poucos vão marcando a sua presença, quase uma por cada país. Estes quistos de extrema-direita alastram onde menos seria de esperar. A última vítima foi a França, nação-berço dos Direitos Humanos, uma das mais importantes referências da construção europeia. A principal consequência imediata desta doença foi o fim da carreira política de Lionel Jospin, o mesmo político que algumas figuras da chamada "ala esquerda" do PS, como Mário Soares ou Manuel Alegre, tanto têm elogiado, graças à sua enorme "visão estratégica", que o fez aliar-se com o ortodoxo Partido Comunista Francês numa coligação governamental de "grande sucesso". Pois aí estão as consequências deste pretenso iluminismo ideológico: a segunda volta das presidenciais será disputada entre a tradicional direita gaullista e a extrema-direita, e às eleições francesas concorreram alguns dos espécimens mais retrógados e inimagináveis do jardim zoológico político em que a esquerda francesa se transformou. Como é possível que em 2002 ainda existam 3 candidatos trotskistas? Tudo isto tem, no entanto, consequências extremamente graves, não só para o PS francês, mas para a democracia em geral. Este tipo de irresponsabilidades ideológicas leva naturalmente ao surgimento de aberrações da democracia, como Le Pen, Haider ou Bossi, para citar só os mais conhecidos. Por tudo isto, o "caso francês" deve ser cuidadosamente analisado, para que entre nós os políticos do chamado bloco central não cometam os mesmos erros. Contudo, basta um rápido olhar sobre o que se passou em França para se perceberem algumas arrepiantes semelhanças entre o "caso francês" e a política portuguesa dos últimos tempos: Lionel Jospin foi a quarta escolha para o cargo de dirigente máximo do PS francês, ao passo que Ferro Rodrigues foi a terceira escolha para o correspondente cargo em Portugal, depois de António Vitorino e Jaime Gama. Por outro lado, é importante notar-se que nas últimas eleições legislativas o BE quase que duplicou a sua votação e que, pela primeira vez desde o 25 de Abril, tivemos um partido fascista a concorrer às eleições legislativas nacionais (o PNR). Tudo isto são sinais mais do que preocupantes da degradação progressiva do espectro político português, com os votos nos extremos a surgirem como forma de protesto contra o rumo que os políticos deram à política em Portugal. Depois da patetice alegre e assustadiça que foi o "guterrismo", será que vamos agora ter um "ferrismo" autista com ideologias há 10 anos fora do prazo? Quando é que o PS percebe que o seu lugar político é o centro e que quaisquer aproximações aos decrépitos cacos do Muro de Berlim apenas servem para o integrar na dinâmica de degradação que parece ter atingido a esquerda mundial? O Partido Trabalhista de Tony Blair e o Partido Democrata de Bill Clinton foram dois excelentes exemplos de como é possível conciliar as preocupações sociais com um liberalismo económico progressivo. Será que o aviso francês vai chegar a Portugal? Ou será que nos vamos todos embebedar com os 80% que Chirac vai ter na segunda volta das eleições, para a seguir aguardarmos com alegria a chegada do vírus ao nosso país?
Para os próximos dias prometo publicar as minhas opiniões sobre o triste orçamento-fósforo (depois explicarei esta analogia) que a CME propõe para 2003 e que será discutido pela AM na próxima 5ª feira.
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