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sexta-feira, outubro 14, 2005

Tal como todos sabemos, Estarreja é sociologicamente de direita. Embora alguns acreditassem que os oito anos de governação PS na CME e os bons resultados obtidos nas eleições de 1989 e 2001 pudessem significar que o PS já teria uma maior implantação social em Estarreja, a verdade é que estas eleições provam precisamente o contrário, tal como a vitória do PSD de Santana Lopes nas legislativas de Fevereiro já o havia demonstrado.
Para perceber as razões da actual derrota, talvez seja importante recordar os motivos que levaram aos bons resultados (do PS e do PSD):
- Em primeiro lugar, o candidato à presidência da CME. Quando Vladimiro Silva concorreu em 1993, tinha uma história pessoal de intensa actividade política e social, tendo passado pela Assembleia de Freguesia de Salreu e Assembleia Municipal, pelas direcções de várias colectividades locais e tinha múltiplas intervenções políticas, quer na rádio, quer nos jornais locais. As pessoas conheciam-no e sabiam do que ele era capaz. Este aspecto é particularmente importante, pois com José Eduardo de Matos passou-se mais ou menos o mesmo: quando JEM concorreu em 1997 já era longa a sua experiência política e social. Muito dificilmente um candidato poderá ambicionar ganhar uma Câmara Municipal sem este tipo de notoriedade pública;
- Em segundo lugar, a política. Embora Vladimiro Silva fosse um homem de esquerda (foi militante do PCP até ao início dos anos 80), a verdade é que a sua governação e o estilo político que sempre adoptou estavam muito mais próximos do que é habitual nos partidos de direita. Uma liderança firme, afirmativa e sem medo de conflitos agrada principalmente ao eleitorado de direita. Por outro lado, a preocupação em promover uma actividade cultural de elite (aqui Fernando Mendonça teve um papel decisivo) e em dar particular relevo à intervenção social (com a importantíssima colaboração de Alberto Vidal) garantiu o apoio do lado esquerdo do eleitorado e uma mobilização transversal da sociedade. Politicamente, não há comparação possível com José Eduardo de Matos, que inverteu completamente o estilo do executivo camarário: a política cultural passou a ser palco de conflitos pessoais do presidente com algumas instituições do concelho e a ter um carácter muito mais popular, enquanto que a intervenção social passou a ser predominantemente assistencialista, o que é uma característica muito própria dos partidos de direita. No entanto, nestas áreas JEM jogou em casa: a sua base social de apoio estava perfeitamente satisfeita com este tipo de intervenções;
- Em terceiro lugar, o marketing. Esta é uma área cuja importância atingiu o seu expoente máximo no actual mandato de José Eduardo de Matos. O gabinete de imprensa da CME funcionou de uma forma bastante eficaz e produtiva durante 4 anos (foram várias as notícias que se conseguiram colocar nos vários órgãos de comunicação social) e os boletins municipais (embora com repetições cíclicas de obras e fotos...) conseguiram transmitir uma imagem de dinamismo da actividade do município. Entretanto, o PS reagia mal ao protagonismo de JEM na comunicação social e praticamente abdicou da luta mediática na imprensa (exceptuando o caso do Voz Regionalista). Este foi um aspecto determinante também nas candidaturas de Vladimiro Silva, que em 1989 e sobretudo em 1993 soube chegar ao coração da imprensa e utilizar a seu favor os órgãos de comunicação social. Mesmo à medida que as relações com alguma imprensa se iam degradando, VS soube sempre tirar partido disso e apresentar-se como um lutador contra todas as adversidades. Embora com formas de organização variáveis, o marketing político foi sempre extremamente importante para se ganharem eleições em Estarreja;
- Em quarto lugar, a gestão política das relações com os opositores. E neste aspecto, tanto Vladimiro Silva como José Eduardo de Matos foram mestres. VS soube modelar a sua relação com Maria de Lurdes Breu (assumindo uma postura colaborante, mas marcando diferenças), Dario Matos (fazendo uma campanha pela positiva, evitando ataques pessoais) e até José Eduardo de Matos (defendendo-se dos ataques, como forma de marcar a diferença entre os que "fazem" e os que "falam"). José Eduardo de Matos esteve sempre bastante atento aos argumentos da oposição (e neste aspecto a blogosfera, a começar por este blogue, foi um enorme tiro pela culatra) e soube antecipar respostas e acções. Evitou conflitos directos com Teixeira da Silva e fez a campanha como se não existisse oposição, embora com o cuidado de evitar sinais públicos de arrogância (quando não há acto mais arrogante que o de ignorar o adversário...). A estratégia foi de facto brilhante e os resultados estão aí para o demonstrar.

Se analisarmos retrospectivamente todos estes factores, verificamos que a actual candidatura do PS falhou em praticamente todos os pontos, o que poderá servir para explicar o desastre eleitoral.
Embora os prognósticos no fim do jogo sejam sempre muito mais confortáveis e seguros (e talvez até imorais), penso que devemos olhar para o que aconteceu numa perspectiva de futuro. Só a correcção de todos estes erros poderá permitir ao PS recuperar a Câmara Municipal de Estarreja. No entanto, Roma não se construiu num dia...

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