quarta-feira, julho 06, 2011
Parece coincidência, é coincidência, mas não acontece por coincidência: o texto que escrevi ontem foi mesmo escrito antes da sacanice da Moodys.
Pedro Santos Guerreiro, do Jornal de Negócios, diz tudo o que há para dizer sobre este assunto, e que encaixa na perfeição nos múltiplos textos que tenho escrito aqui, no FB e nas caixas de comentários de blogues diversos um pouco por toda a web. Mais uma vez a Europa está de gatas, a dormir na forma e a deixar que aconteça aquilo de que todos estão à espera...
Pedro Santos Guerreiro, do Jornal de Negócios, diz tudo o que há para dizer sobre este assunto, e que encaixa na perfeição nos múltiplos textos que tenho escrito aqui, no FB e nas caixas de comentários de blogues diversos um pouco por toda a web. Mais uma vez a Europa está de gatas, a dormir na forma e a deixar que aconteça aquilo de que todos estão à espera...
You bastards
06 Julho2011 | 09:04
Pedro Santos Guerreiro - psg@negocios.pt
Pedro Santos Guerreiro | |
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ARTIGOS DESTE AUTOR
Choque. Escândalo. Lixo. Resignação? Não. Mas sim, lixo, somos lixo. Os mercados são um pagode, e nós as escamas dos seus despojos.
Isto não é uma reacção emotiva. Nem um dichote à humilhação. São os factos. Os argumentos. A Moody's não tem razão. A Moody's não tem o direito. A Moody's está-se nas tintas. A Moody's pôs-nos a render. E a Europa rendeu-se.
As causas da descida do "rating" de Portugal não fazem sentido. Factualmente. Houve um erro de cálculo gigantesco de Sócrates e Passos Coelho quando atiraram o Governo ao chão sem cuidar de uma solução à irlandesa. Aqui escrevi nesse dia que esta era "a crise política mais estúpida de sempre". Foi. Levámos uma caterva de cortes de "rating" que nos puseram à beira do lixo. Mas depois tudo mudou. Mudou o Governo, veio uma maioria estável, um empréstimo de 78 mil milhões, um plano da troika, um Governo comprometido, um primeiro-ministro obcecado em cumprir. Custe o que custar. Doa o que doer. Nem uma semana nos deram: somos lixo.
As causas do corte do "rating" não fazem sentido: a dificuldade de reduzir o défice, a necessidade de mais dinheiro e a dificuldade de regressar aos mercados em 2013 estão a ser atacadas pelo Governo. Pelo País. Este corte de "rating" não diagnostica, precipita essas condenações. Portugal até está fora dos mercados, merecia tempo para descolar da Grécia. Seis meses, um ano.
Só que não é uma questão de tempo, é uma questão de lucro, é uma guerra de poder. Esta decisão tem consequências graves e imediatas. Não apenas porque o Estado fica mais longe de regressar aos mercados. Mas porque muitos investidores venderão muitos activos portugueses. Porque é preciso reforçar colaterais das nossas dívidas. Porque hoje todos os nossos activos se desvalorizam. As nossas empresas, bancos, tudo hoje vale menos que ontem. Numa altura de privatizações. De testes de "stress". Já dei para o peditório da ingenuidade: não há coincidências. Hoje milhares de investidores que andaram a "shortar" acções e dívidas portuguesas estão ricos. Comprar as EDP e REN será mais barato. Não estamos em saldos, estamos a ser saldados. Salteados.
Portugal foi um indómito louco, atirou-se para um precipício, agarrou-se à corda que lhe atiraram. Está a trepar com todas as forças, lúcido e humilde como só alguém que se arruína fica lúcido e humilde. Veio a Moody's, cuspiu para o chão e disse: subir a corda é difícil - e portanto cortou a corda.
Tudo isto não é por causa de Portugal, é por causa da guerra entre os EUA e a Europa, é por causa dos lucros dos accionistas privados e nunca escrutinados das "rating". Há duas semanas, um monumental artigo da jornalista Cristina Ferreira no "Público" descreveu a corrosão. Outra jornalista, Myret Zaki, escreveu o notável livro "La fin du Dollar" que documenta o "sistema" de que se alimentam estas agências e da guerra dólar/euro que subjaz.
Ontem, Angela Merkel criticou o poderio das agências e prometeu-lhes guerra. Não foi preciso 24 horas para a resposta: o aviso da Standard & Poors de que a renovação das dívidas à Grécia será considerado "default" selectivo; a descida de "rating" da Moody's para Portugal.
Estamos a assistir a um embuste vitorioso e a União Europeia não é uma potência, é uma impotência. Quatro anos depois da crise que estas agências validaram, a Europa foi incapaz de produzir uma recomendação, uma ameaça, uma validação aos conflitos de interesse, uma agência de "rating" europeia. Que fez a China? Criou uma agência. Que diz essa agência? Que a dívida portuguesa é BBB+ (semelhante ao da canadiana DBRS: BBB High). Que a dívida americana já não é AAA. Os chineses têm poder e coragem, a Europa deixou-se pendurar na Loja dos Trezentos... dos americanos.
Anda a "troika" preocupada com a falta de concorrência em Portugal... E a concorrência ente as agências de "rating"? Há dois dias, Stuart Holland, que assinou o texto apoiado por Mário Soares e Jorge Sampaio por um "New Deal" europeu, disse a este jornal: é preciso ter os governos a governar em vez das agências de 'rating' a mandar.
Não queremos pena, queremos justiça. A Europa fica-se, não nos fiquemos nós. O Banco Central Europeu tem de se rebelar contra esta ditadura. Em Outubro, o relatório do Financial Stability Board, que era liderado por Mário Draghi, aconselhava os bancos e os bancos centrais a construírem modelos próprios para avaliarem a eligilibidade dos instrumentos financeiros por estes aceites e pôr termo ao automatismos das avaliações das agências de rating. Draghi vai ser o próximo presidente do BCE. Não precisa de acabar com as agências de "rating", precisa de levantar-se destas gatas.
Este corte de "rating" é grave. É uma decisão gratuita que nos sai muito cara. Portugal é o lixo da Europa. As agências de "rating" são os cangalheiros, ricos e eufóricos, de um sistema ridiculamente inexpugnável. As agências garantem que nada têm contra Portugal. Como dizia alguém, "isto não é pessoal, apenas negócios". Esse alguém era um padrinho da máfia.
Este Editorial está disponível numa versão traduzida em inglês disponível neste link.
As causas da descida do "rating" de Portugal não fazem sentido. Factualmente. Houve um erro de cálculo gigantesco de Sócrates e Passos Coelho quando atiraram o Governo ao chão sem cuidar de uma solução à irlandesa. Aqui escrevi nesse dia que esta era "a crise política mais estúpida de sempre". Foi. Levámos uma caterva de cortes de "rating" que nos puseram à beira do lixo. Mas depois tudo mudou. Mudou o Governo, veio uma maioria estável, um empréstimo de 78 mil milhões, um plano da troika, um Governo comprometido, um primeiro-ministro obcecado em cumprir. Custe o que custar. Doa o que doer. Nem uma semana nos deram: somos lixo.
As causas do corte do "rating" não fazem sentido: a dificuldade de reduzir o défice, a necessidade de mais dinheiro e a dificuldade de regressar aos mercados em 2013 estão a ser atacadas pelo Governo. Pelo País. Este corte de "rating" não diagnostica, precipita essas condenações. Portugal até está fora dos mercados, merecia tempo para descolar da Grécia. Seis meses, um ano.
Só que não é uma questão de tempo, é uma questão de lucro, é uma guerra de poder. Esta decisão tem consequências graves e imediatas. Não apenas porque o Estado fica mais longe de regressar aos mercados. Mas porque muitos investidores venderão muitos activos portugueses. Porque é preciso reforçar colaterais das nossas dívidas. Porque hoje todos os nossos activos se desvalorizam. As nossas empresas, bancos, tudo hoje vale menos que ontem. Numa altura de privatizações. De testes de "stress". Já dei para o peditório da ingenuidade: não há coincidências. Hoje milhares de investidores que andaram a "shortar" acções e dívidas portuguesas estão ricos. Comprar as EDP e REN será mais barato. Não estamos em saldos, estamos a ser saldados. Salteados.
Portugal foi um indómito louco, atirou-se para um precipício, agarrou-se à corda que lhe atiraram. Está a trepar com todas as forças, lúcido e humilde como só alguém que se arruína fica lúcido e humilde. Veio a Moody's, cuspiu para o chão e disse: subir a corda é difícil - e portanto cortou a corda.
Tudo isto não é por causa de Portugal, é por causa da guerra entre os EUA e a Europa, é por causa dos lucros dos accionistas privados e nunca escrutinados das "rating". Há duas semanas, um monumental artigo da jornalista Cristina Ferreira no "Público" descreveu a corrosão. Outra jornalista, Myret Zaki, escreveu o notável livro "La fin du Dollar" que documenta o "sistema" de que se alimentam estas agências e da guerra dólar/euro que subjaz.
Ontem, Angela Merkel criticou o poderio das agências e prometeu-lhes guerra. Não foi preciso 24 horas para a resposta: o aviso da Standard & Poors de que a renovação das dívidas à Grécia será considerado "default" selectivo; a descida de "rating" da Moody's para Portugal.
Estamos a assistir a um embuste vitorioso e a União Europeia não é uma potência, é uma impotência. Quatro anos depois da crise que estas agências validaram, a Europa foi incapaz de produzir uma recomendação, uma ameaça, uma validação aos conflitos de interesse, uma agência de "rating" europeia. Que fez a China? Criou uma agência. Que diz essa agência? Que a dívida portuguesa é BBB+ (semelhante ao da canadiana DBRS: BBB High). Que a dívida americana já não é AAA. Os chineses têm poder e coragem, a Europa deixou-se pendurar na Loja dos Trezentos... dos americanos.
Anda a "troika" preocupada com a falta de concorrência em Portugal... E a concorrência ente as agências de "rating"? Há dois dias, Stuart Holland, que assinou o texto apoiado por Mário Soares e Jorge Sampaio por um "New Deal" europeu, disse a este jornal: é preciso ter os governos a governar em vez das agências de 'rating' a mandar.
Não queremos pena, queremos justiça. A Europa fica-se, não nos fiquemos nós. O Banco Central Europeu tem de se rebelar contra esta ditadura. Em Outubro, o relatório do Financial Stability Board, que era liderado por Mário Draghi, aconselhava os bancos e os bancos centrais a construírem modelos próprios para avaliarem a eligilibidade dos instrumentos financeiros por estes aceites e pôr termo ao automatismos das avaliações das agências de rating. Draghi vai ser o próximo presidente do BCE. Não precisa de acabar com as agências de "rating", precisa de levantar-se destas gatas.
Este corte de "rating" é grave. É uma decisão gratuita que nos sai muito cara. Portugal é o lixo da Europa. As agências de "rating" são os cangalheiros, ricos e eufóricos, de um sistema ridiculamente inexpugnável. As agências garantem que nada têm contra Portugal. Como dizia alguém, "isto não é pessoal, apenas negócios". Esse alguém era um padrinho da máfia.
Este Editorial está disponível numa versão traduzida em inglês disponível neste link.
Comments:
Ora, não este corte não é nada surpreendente: o outlook era negativo e a tendência era esta mesmo.
Excitações patróticas à parte, mais um imposto de 50% sobre o rendimento do trabalho é um reconhecimento da incapacidade do Estado em emagrecer o próprio Estado. Portugal não tem ponta por onde se lhe pegue e devia ter pensado nos efeitos perniciosos das maléficas "agências" e dos "sinistros" mercados antes de se endividar até à medula por gastar à tripa-forra.
Excitações patróticas à parte, mais um imposto de 50% sobre o rendimento do trabalho é um reconhecimento da incapacidade do Estado em emagrecer o próprio Estado. Portugal não tem ponta por onde se lhe pegue e devia ter pensado nos efeitos perniciosos das maléficas "agências" e dos "sinistros" mercados antes de se endividar até à medula por gastar à tripa-forra.
Caro Peliteiro: tens razão em duas coisas (a previsibilidade do corte e o mau estado da economia), mas não na conclusão - se estivéssemos a falar de futebol, esta tinha sido uma entrada "à Paulinho Santos" da Moody's ao Passos Coelho, 1 minuto depois dele ter entrado em campo a substituir o Sócrates e quando ainda mal tinha tocado na bola.
Isto foi um acto de política pura - não teve nada de economia (a não ser na parte de influência escandalosa dos mercados).
Isto foi um acto de política pura - não teve nada de economia (a não ser na parte de influência escandalosa dos mercados).
Caro Vladimiro,
Ok, aceitando que sim, que é de política e não de economia de que falamos, vale a pena começar a trabalhar mais e a pedir menos empréstimos ou podemos continuar a dizer mal da Moody's? ;)
Ok, aceitando que sim, que é de política e não de economia de que falamos, vale a pena começar a trabalhar mais e a pedir menos empréstimos ou podemos continuar a dizer mal da Moody's? ;)
Ora aí está! Estou plenamente de acordo contigo! A única solução é mandá-los emprestar dinheiro ao Burkina Faso :)
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