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terça-feira, setembro 18, 2012

O melhor texto sobre a TSU é este, do André Barata (eu próprio voltarei a escrever sobre isto ainda esta semana):


A índole da TSU


Há empresas que estão a dizer aos seus empregados que, mesmo que o Governo levasse as suas intenções para 2013 avante, não lhes fariam a retenção de TSU acrescida de 7%. Decidem assim salvaguardar o rendimento do trabalho dos seus trabalhadores. E se a vontade do Governo vingar, até significa que estas empresas estariam dispostas a suportar um aumento da sua contribuição social face ao que têm pago até agora, uma vez que a TSU total, contando com a contribuição de ambas as partes, empregado e empregador, sobe 1, 25% (de 34,75% para 36%). Ou seja: há empresas efectivamente dispostas, ao arrepio de todo o moralismo ressentido de Passos Coelho e de todas as convicções cegas às consequências de Vítor Gaspar, a aumentar os seus custos unitários de trabalho. Melhor ainda: são empresas claramente vocacionadas para a actividade exportadora as primeiras a tornar pública esta posição. Com a ironia, mas também a sabedoria, de terem tido um passado de muito sacrifício para os trabalhadores, são precisamente empresas do sector do calçado a virem a público. Este é um sinal extraordinário. Pelos meios próprios das empresas, que necessariamente são diferentes dos que estão à mão dos trabalhadores, ou dos cidadãos, vemos o mesmo veemente repúdio da medida governamental que levou os portugueses a manifestar-se maciçamente.
Vale a pena reflectir sobre este sinal extraordinário. Nele reflecte-se por que razão este Governo nem sequer governa em favor dos patrões, tratando-se todo ele de um colossal erro de casting de que os portugueses, sejam de esquerda sejam de direita, têm de se ver livres rapidamente. Como pensar outra coisa depois da proposta de transferir a TSU a cargo dos patrões para os seus trabalhadores? Há um sentido de indecência nesta transferência que nem ao patronato escapa. É que todos, com algumas excepções que agora não vêm ao caso, mas dizia, todos nós, empregadores e empregados, frequentámos a escola, formámo-nos pessoalmente entre valores familiares, culturais, civis, até religiosos e que garantem bases mínimas de entendimento e convivialidade. É essa base mínima de entendimento, sem a qual também nenhumas divergências podem conviver, que ao anúncio da medida de transferir a TSU dos empregadores para os empregados pôs em causa. E isto acontece da mesma maneira que seria de esperar, entre pessoas bem formadas, grande desconforto em se obter um ganho directo à custa de uma perda directa de outrem  – há qualquer coisa de indecoroso em sentir que o dinheiro que nos vem parar às mãos é dinheiro que traz ainda o cheiro da carteira alheia, sim, algo que, lá no fundo, nos faz sentir que nos apropriamos indevidamente do que não é nosso. Compreendo perfeitamente Luís Onofre, empresário do calçado, quando dizia ontem: “O dinheiro que eu ganhar será diretamente para os trabalhadores”.
À decência relacional que leva empresários a não querer sequer tocar no dinheiro da TSU, juntam-se outras razões para o unânime repúdio da acção do Governo:
  1. A medida é desproporcionada pois tem um enorme impacto nas vidas daqueles que mais têm suportado o esforço nacional no sentido de reequilibrar as contas públicas, mas sem que esta medida em particular, apesar de tão penalizadora, consiga mais que um efeito marginal na melhoria das contas públicas.
  2. A  medida é abusiva, pois exige aos mesmos que já têm o fardo, com enormes sacrifícios, de restabelecer as contas públicas que se disponham agora a suportar também um segundo fardo, de relançamento da economia.
  3. A medida é errada, pois as bases de relançamento da economia nacional baseadas no empobrecimento forçado da sociedade e destruição do consumo interno estão erradas. Além de que já há contra-evidência de que a medida proporcione qualquer ganho em matéria de criação de emprego.
  4. A medida é instrumentalizadora, pois exige que as pessoas sirvam de instrumentos para derivas experimentalistas que não têm base histórica nenhuma, que permanecem modelarmente problemáticas e que não dispõem de outra base empírica do que o “deixar correr” um modelo programado num software.
  5. A medida é desumana pois leva 7% do rendimento bruto dos assalariados, mas, e isto é que importa salientar, leva na verdade o que restava do rendimento disponível dos assalariados, se ainda algum rendimento restava e se, em bom rigor, não está já em causa uma generalizada entrada das famílias portuguesas em incumprimento com as suas contas de gás, electricidade, água, transportes públicos, supermercado, isto só para me restringir a exemplos relacionados com necessidades básicas para se viver.
  6. A medida é desleal, pois está visto que se trata de um imposto encapotado, que desrespeita o princípio da progressividade, fazendo do compromisso com a justiça social uma anedota. Quando um Governo encapota as suas acções assim, em flagrante delito, contra a Constituição e o contrato social que nos une a todos, ou alguém o faz capotar ou o melhor que faz é enfiar-se escondido num capote e pôr-se a andar.
Eis a índole da TSU: fundamentalmente errada, abusiva, instrumentalizadora, desumana, desleal e, à cabeça, basicamente indecente.

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