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terça-feira, abril 04, 2006

Há dias um ilustre visitante deste blogue (ele sabe quem é), com algumas razões de queixa pessoais em relação à política errática de um dos Ministros do actual governo, dizia-me que apesar de tudo não concordava com o que eu aqui havia escrito sobre o governo Sócrates (neste post, a propósito do novo populismo). Tive que lhe responder o habitual: que num blogue as coisas são sempre exageradas e se racionalizarmos tudo o que realmente se passa há inevitavelmente pontos fortes e fracos. Assim, e concretizando este (pequeno e esperemos que fugaz) laivo de honestidade intelectual, cá fica uma análise mais justa ao desempenho do governo:
Pontos fortes:
- A relativa coesão do governo. Apesar de embaraços pontuais (o safari no Quénia, o corte da palavra a Manuel Alegre, o ex-Ministro das Finanças, o simples respirar de Freitas do Amaral, etc.) o governo tem-se aguentado à bronca e não é frequente assistirmos a cenas como as que caracterizaram principalmente a governação de Santana Lopes, com desmentidos e trementidos de manhã, à tarde e à noite;
- O Ministro das Finanças Teixeira dos Santos - depois de Campos e Cunha não ter cedido nas suas posições sobre os disparates da Ota e do TGV, temia-se que o novo MF fosse apenas um yesman. No entanto, Teixeira dos Santos tem-se mantido firme e a seriedade, frontalidade e credibilidade com que fala das contas públicas têm contribuído para dar segurança à Economia, muitas vezes apesar do que fazem os seus colegas de governo;
- O Ministro António Costa - para muitos o "Primeiro-Ministro sombra". AC já tinha dado provas no tempo em que foi Ministro da Justiça dos governos Guterres e agora o seu espírito reformista e capacidade empreendedora parecem estar de volta;
- A Ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues, pela coragem na tentativa de racionalização de um tema tão difícil como o do fecho das escolas. No entanto, várias questões pontuais e pouco claras têm colocado dúvidas que mancham o mérito da proposta;
- O Ministro do Trabalho e Segurança Social Vieira da Silva tem sido claro e a sua actuação tem sido positiva. A sua participação no PRACE é pelo menos um sinal de boas intenções e sem dúvida um sintoma de peso político, que para o seu Ministério é indispensável.
Pontos Fracos:
- O Ministro da Economia Manuel Pinho é cada vez mais uma carta fora do baralho governamental. Perdeu o Plano Tecnológico, esteve mal no caso da Iberdrola e da fusão EDP-Gás Natural, não soube reagir ao processo de fusão no sector energético espanhol e a API parece ter deixado de funcionar. E o pior é que todos sabem que MP está a prazo no governo...
- Mariano Gago, o Ministro da Ciência e Tecnologia está lentamente a perder o capital de prestígio (imerecido, na minha opinião) que havia ganho no governo Guterres: ficou mal na fotografia do protocolo com o MIT, fez figura de sabujo com Bill Gates, o modo como o dossier "Bolonha" tem sido gerido é no mínimo preocupante e as reformas do sistema universitário tardam e, tal como antes, não virão. Gago é a marca mais visível do guterrismo no actual governo;
- José Sócrates tem sido um Primeiro-Ministro cujo único mérito parece ser a capacidade de gerir silêncios, tomar medidas que agradem aos opinion makers dos media e vestir bons fatos (Armani?). O seu discurso é simplório e faz tristemente lembrar o primarismo de George W. Bush ("the axis of evil", "either you're with the good guys or with the bad guys", "this is the guy who tried to kill my father", etc.). Sócrates governa para e a partir da imprensa e percebe-se que controla minuciosamente a imagem do governo. Não se tem a mesma certeza em relação à actuação do mesmo...
Pontos Negros:
- O Ministro das Obras Públicas Mário Lino, pela lata de avançar com a Ota e TGV no actual momento;
- O Ministro da Saúde Correia de Campos, por ter transformado o exercício da governação numa oportunidade de resolução de rixas pessoais, mesmo que à custa da Saúde da população. A forma leviana e irresponsável como o governo legislou no caso dos medicamentos não sujeitos a receita médica é o exemplo mais óbvio desta actuação, mas todo o resto da política do medicamento é exemplo desta forma de agir: a diminuição da comparticipação dos medicamentos, o abandono da promoção da prescrição de genéricos e por DCI, o acordo com a Indústria Farmacêutica, a não implementação de medidas de controlo da prescrição, etc. são actos extremamente negativos e com grande impacto na vida das populações que a imprensa ignora pelo simples facto de CC estar entretido a fazer cócegas à ANF. No entanto, o pior dos actos de CC aconteceu quando o Ministro pôs em causa o SNS tal como o conhecemos: embora a frase fosse propositadamente provocatória e tivesse sido dita para testar reacções, todos perceberam que, se as coisas dependerem apenas da vontade de CC, o SNS tal como o conhecemos acabará e será substituído por um qualquer sistema misto com seguradoras à mistura... é incrível a margem de manobra que o facto de enfrentar a ANF deu a este homem: depois deste "acto corajoso", tudo se lhe perdoa. Mesmo a eliminação do SNS...

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Comments:
Apesar do pouco tempo a que este governo está em funções, devemos admitir que já fez estória, duvidando de que venha a fazer história.

O post, com o qual concordo de forma geral, trouxe-me à lembrança figuras verdadeiramente bizarras como é o caso do Mário Lino - o Lino das obras - a qual eu tinha esquecido totalmente. O homem ainda é vivo?
Os Costas também são um belíssimo par e esta embrulhada com a PJ é um exemplo do que não deve ser a política.

De acordo quanto ao papel do Snr. Engenheiro; fatos Armani, gestão de silêncios e, acrescentaria, até há pouco, controlo absoluto de todos os elementos do seu governo.
Cpts.
 
E o senhor Diogo? A sua capacidade para o disparate é uma mais valia!
 
Caríssimo,

Folgo em ver que, apesar de um tanto a contra gosto, o estilo Sócrates já te conseguiu tocar um bocadinho... Eu sei que é díficil para alguém que nunca o apoiou, reconhecer que o homem até é razoável...

Sem quaisquer problemas, assumo que votei Sócrates! Não votei pelo PS, mas votei Sócrates. Acredito sinceramente que o País precisava de um PM com estilo do actual. É óbvio que tenho dúvidas que seja capaz de fazer tudo o que promete, mas entre ele e Santana.... Nem há comparação possível!

Concordo, em linhas gerais, com a tua análise relativamente ao melhor e ao pior mais, particularmente, em relação aos pontos negros.

Não posso concordar com a crítica que fazes do PM. Se há alguma coisa que tem feito deste, o melhor governo dos últimos 20 anos, é precisamente o estilo Sócrates. Isto enjoa. Duvido que daqui a 3 anos ainda me apeteça gramar com isto... Entretanto vem um Santaninha qualquer para animar o pessoal e lá ficamos todos contentes!

Apesar de tantos elogios que faço ao homem, não tenho a certeza que este seja um bom governo. Para isso teria que lhe reconhecer uma visão estratégica de futuro que, sinceramente, não vislumbro. Mas é sem qualquer dúvida o menos mau que temos tido.

Relativamente à minha área de interesse, lamento o nojo de minitro da Saúde que temos. E será ainda mais desprezível quando se perceber que nada muda e que todo este aparato e toda esta guerra (aparente) com a ANF não foi mais que uma estratégia negocial para extremar posições ao máximo, de modo a sacar os melhores benefícios... Resta saber para quem serão!
 
Caros comentadores:
- É pertinente a observação do A. Cunha: de facto, só por descuido da minha parte é que Freitas foi esquecido dos pontos negros. O Ministro do Bloco de Esquerda tem posturas indefensáveis e a humilhação que sofreu aos pés do seu homólogo dinamarquês era perfeitamente escusada. E mesmo agora na questão canadiana tenho a sensação de que qualquer outro conseguiria mais...
- Quanto às observações do farmasa sobre o estilo Sócrates, faz-me recordar uma frase que um dia alguém disse sobre Paulo Futre: é capaz de fintar sete defesas dentro de uma cabine telefónica, mas a seguir não encontra a saída. Com Sócrates é mais ou menos o mesmo: consegue ser autoritário e determinado em tudo e mais alguma coisa, mas depois não usa as decisões que toma com qualquer desígnio estratégico palpável. É que a capacidade de tomar decisões é um meio e não um fim do exercício do cargo de PM!
 
Caro Miro,

O PM está farto de fintar e, a verdade é que tem marcado muitos golos...

Esse argumento de que o Sócrates só trata do show e nada da substância é totalmente injusto e só pelo prazer da crítica se pode utilizar. É óbvio que sabe comunicar e que faz disso uma peça chave do seu estilo. Mas isso não faz dele um político como George W. Bush.

Algum governo, nos últimos anos, decidiu tanto em tão pouco tempo? Podes argumentar, tal como eu, que é muito pouco perante o que há para fazer. Podemos dizer que, provavelmente, mesmo com tanto autoritarismo, vão continuar a haver "vacas sagradas" e claro, que alguns lobbies devidamente satisfeitos.

Eu, tal como tu, sabemos que há muita podridão no meio político e, talvez por isso tenhamos a impressão que é difícil fazer alguma coisa por isto.

Apesar disso (e não é pouco) acho que o PM tem a atitude correcta. Repito que o governo não é bom: é menos mau. Mas ainda é assim, talvez pelo nível de exigência ter baixado demasiado, estou medianamente satisfeito..
 
Caro Miro,

Penso que devias fazer estas tuas análises, mais generalistas, um pouco mais aprofundadamente e não apenas com comentários pela rama sobre muitos dos dossiers que estão a ser tratados pelos Ministérios, incluindo o da Economia. Aliás, à semelhança do que fazes (independentemente de concordar ou discordar) com a questão dos genéricos e dos fármacos.

É que assim não contribuis para o esclarecimento, mas apenas para a demagogia
 
Caro Pedro Vaz:

Numa análise política e geral não é possível descer ao pormenor. Por isso referi apenas alguns dos aspectos que para mim são mais marcantes da actuação de alguns ministros. Concordo com o farmasa quando ele diz que, de um modo geral, este é um governo menos mau. O que não quer dizer que seja bom ou que não seja uma enorme desilusão, mesmo para os que (como eu) não conseguiram votar Sócrates...
 
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