sexta-feira, junho 22, 2007
O regresso à vaca fria...
O Atento escreveu isto no Impressões de um Boticário de Província:
Desculpe lá, mas tenho vindo a ler as suas opiniões e tenho umas questões para lhe fazer:
1) Acena várias vezes com a ameaça da monopolização da propriedade das farmácias por meia dúzia de multinacionais poderosas e com interesses meramente económicos. No entanto, a legislação irá prever que cada proprietário só poderá ser proprietário de, no máximo, 4 farmácias. Como explica isto?
2) Outros "negócios" altamente lucrativos, como as clínicas médicas privadas (provavelmente não tão lucrativos quanto as farmácias, mas na mesma "bons negócios"), têm a sua propriedade liberalizada e não exclusiva a médicos. No entanto, arrisco dizer que a maioria dos seus proprietários continuam a ser médicos e que, até agora, em tantos anos, ainda não há nenhuma rede multinacional à lá McDonald's da Medicina que se tenha "apropriado" das clínicas médicas. Como explica isto?
...ao que o Peliteiro respondeu (e bem) assim:
Caro Antento, agradeço as suas questões a que vou tentar responder o mais clara e sucintamente possível.
Não se trata de matéria assim tão simples quanto parece numa primeira abordagem. Muito boa gente, muito bem pensante, disse já tremendas enormidades sobre o tema. Infelizmente alguns - menos, muito menos - continuam dizendo.
Saúde e dinheiro são dois bens pouco miscíveis e este meu texto procura ter o mesmo registo que o seu: falando de negócios.
Para facilitar o entendimento das minhas respostas, dois pontos de esclarecimento preliminares:
i Esta ligação que permite ler muito do já escrevi sobre o tema e
ii aquilo que eu considero ser o cerne, a alma, o âmago da problemática (tudo o resto é acessório, menor, irrisório) - O NÚMERO DE FARMÁCIAS
Passemos então às respostas concretas:
1) Não explico. Nunca disse isso. Não acontecerá. A não ser que a legislação tal como é conhecida dê lugar a algum "buraco legal" não haverá grandes cadeias de Farmácias.
O que ocorrerá - com mais ou menos testas-de-ferro - é a propriedade de umas quantas farmácias na mão de uma família ou grupo de pequenos empreiteiros, madeireiros ou picheleiros (sem ofensa para estes empresários, como exemplo apenas), na mão dos filhos dos actuais farmacêuticos proprietários armados em gestores, na mão de uns patos-bravos que pensam que encontraram a árvore das patacas e ficarão enterrados em consumições e dívidas ou outros cenários similares.
A meia dúzia de multinacionais poderosas a que se refere ocorreriam num cenário de liberalização de instalação que não acontecerá.
2) Não concordo. Basta ler os jornais económicos para ver que a medicina privada está cada vez mais concentrada na mão de uns poucos grupos económicos; por enquanto todos nacionais mas logo veremos se assim continua. Ah, e as Misericórdias e o Monjardino. As pequenas clínicas de bairro a que penso que se refere são um negócio residual, progressivamente insignificante.
... e eu, qual opinador irrequieto, acrescentei isto:
Caro Peliteiro:
Permite-me que discorde parcialmente de ti.
Tens razão quando dizes que não vamos ter multinacionais com a nova lei. De facto, assim é. No entanto, com a entrada de novos agentes no sector vamos assistir (aliás, já estamos a começar a assistir) a um novo fenómeno: a criação de redes de farmácias, mesmo que sob diferentes proprietários (filosofia do master/franchisado-McDonald's). E há alguns grupos económicos importantes que se estão a aproximar do sector com esta filosofia, obviamente para mais tarde entrarem de uma forma mais alargada (quando alguém finalmente liberalizar a instalação).
Em relação ao comentário do "Atento", há um aspecto que não é de somenos importância: é que há enormes diferenças entre farmácias e clínicas médicas privadas. Estas dependem do trabalho de meia dúzia de profissionais quase sempre pouco disponíveis e com uma enorme variabilidade de produção quer entre médicos, quer entre especialidades. Nas clínicas tudo é mais variável, menos repetitivo, menos standardizável. O risco é maior, não tanto pela concorrência, mas pela própria natureza do serviço (por exemplo, "mexer" em doentes é mais agressivo que vender-lhes medicamentos) e pela forma como os clientes/utentes percepcionam o serviço prestado.
Numa perspectiva meramente empresarial as farmácias (mesmo que liberalizadas na sua instalação) são muito mais interessantes, dado o grau de controlo que o "gerente" tem possibilidade de exercer sobre o desempenho dos profissionais de saúde, o que já não acontece nas clínicas (os Administradores geralmente não têm capacidade para interferir em decisões sobre utilização de recursos como por exemplo análises ou MCDTs).
Estes aspectos explicam algumas das razões pelas quais há menos McDonalds da Medicina do que haveria da Farmácia, caso a liberalização da instalação avançasse. As outras explicou-as o Peliteiro. De qualquer modo, penso que todos conhecemos alguns exemplos de redes de clínicas (sobretudo na área da Medicina Dentária) em que as coisas já estiveram mais distantes deste cenário...
O Atento escreveu isto no Impressões de um Boticário de Província:
Desculpe lá, mas tenho vindo a ler as suas opiniões e tenho umas questões para lhe fazer:
1) Acena várias vezes com a ameaça da monopolização da propriedade das farmácias por meia dúzia de multinacionais poderosas e com interesses meramente económicos. No entanto, a legislação irá prever que cada proprietário só poderá ser proprietário de, no máximo, 4 farmácias. Como explica isto?
2) Outros "negócios" altamente lucrativos, como as clínicas médicas privadas (provavelmente não tão lucrativos quanto as farmácias, mas na mesma "bons negócios"), têm a sua propriedade liberalizada e não exclusiva a médicos. No entanto, arrisco dizer que a maioria dos seus proprietários continuam a ser médicos e que, até agora, em tantos anos, ainda não há nenhuma rede multinacional à lá McDonald's da Medicina que se tenha "apropriado" das clínicas médicas. Como explica isto?
...ao que o Peliteiro respondeu (e bem) assim:
Caro Antento, agradeço as suas questões a que vou tentar responder o mais clara e sucintamente possível.
Não se trata de matéria assim tão simples quanto parece numa primeira abordagem. Muito boa gente, muito bem pensante, disse já tremendas enormidades sobre o tema. Infelizmente alguns - menos, muito menos - continuam dizendo.
Saúde e dinheiro são dois bens pouco miscíveis e este meu texto procura ter o mesmo registo que o seu: falando de negócios.
Para facilitar o entendimento das minhas respostas, dois pontos de esclarecimento preliminares:
i Esta ligação que permite ler muito do já escrevi sobre o tema e
ii aquilo que eu considero ser o cerne, a alma, o âmago da problemática (tudo o resto é acessório, menor, irrisório) - O NÚMERO DE FARMÁCIAS
Passemos então às respostas concretas:
1) Não explico. Nunca disse isso. Não acontecerá. A não ser que a legislação tal como é conhecida dê lugar a algum "buraco legal" não haverá grandes cadeias de Farmácias.
O que ocorrerá - com mais ou menos testas-de-ferro - é a propriedade de umas quantas farmácias na mão de uma família ou grupo de pequenos empreiteiros, madeireiros ou picheleiros (sem ofensa para estes empresários, como exemplo apenas), na mão dos filhos dos actuais farmacêuticos proprietários armados em gestores, na mão de uns patos-bravos que pensam que encontraram a árvore das patacas e ficarão enterrados em consumições e dívidas ou outros cenários similares.
A meia dúzia de multinacionais poderosas a que se refere ocorreriam num cenário de liberalização de instalação que não acontecerá.
2) Não concordo. Basta ler os jornais económicos para ver que a medicina privada está cada vez mais concentrada na mão de uns poucos grupos económicos; por enquanto todos nacionais mas logo veremos se assim continua. Ah, e as Misericórdias e o Monjardino. As pequenas clínicas de bairro a que penso que se refere são um negócio residual, progressivamente insignificante.
... e eu, qual opinador irrequieto, acrescentei isto:
Caro Peliteiro:
Permite-me que discorde parcialmente de ti.
Tens razão quando dizes que não vamos ter multinacionais com a nova lei. De facto, assim é. No entanto, com a entrada de novos agentes no sector vamos assistir (aliás, já estamos a começar a assistir) a um novo fenómeno: a criação de redes de farmácias, mesmo que sob diferentes proprietários (filosofia do master/franchisado-McDonald's). E há alguns grupos económicos importantes que se estão a aproximar do sector com esta filosofia, obviamente para mais tarde entrarem de uma forma mais alargada (quando alguém finalmente liberalizar a instalação).
Em relação ao comentário do "Atento", há um aspecto que não é de somenos importância: é que há enormes diferenças entre farmácias e clínicas médicas privadas. Estas dependem do trabalho de meia dúzia de profissionais quase sempre pouco disponíveis e com uma enorme variabilidade de produção quer entre médicos, quer entre especialidades. Nas clínicas tudo é mais variável, menos repetitivo, menos standardizável. O risco é maior, não tanto pela concorrência, mas pela própria natureza do serviço (por exemplo, "mexer" em doentes é mais agressivo que vender-lhes medicamentos) e pela forma como os clientes/utentes percepcionam o serviço prestado.
Numa perspectiva meramente empresarial as farmácias (mesmo que liberalizadas na sua instalação) são muito mais interessantes, dado o grau de controlo que o "gerente" tem possibilidade de exercer sobre o desempenho dos profissionais de saúde, o que já não acontece nas clínicas (os Administradores geralmente não têm capacidade para interferir em decisões sobre utilização de recursos como por exemplo análises ou MCDTs).
Estes aspectos explicam algumas das razões pelas quais há menos McDonalds da Medicina do que haveria da Farmácia, caso a liberalização da instalação avançasse. As outras explicou-as o Peliteiro. De qualquer modo, penso que todos conhecemos alguns exemplos de redes de clínicas (sobretudo na área da Medicina Dentária) em que as coisas já estiveram mais distantes deste cenário...
Etiquetas: Farmácia, Política de Saúde
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