sábado, janeiro 26, 2008
O Besugo escreveu isto:
Vamos deixar a Espanha inteira e pegar na Galiza. Pegadinha a Trás-os Montes e ao Minho, não é?, pois é, mas deixemos o Minho e a Galiza litoral, a das imigrações, a Galiza mais desenvolvida e povoada. Vamos pegar assim, para ficar mais ou menos equilibrado: Trás-os-Montes e Alto Douro é uma província? É. Ourense é uma província? Pois é, também.
E vamos agora acelerar, que a minha vida não é esta e tenho de me levantar cedo. São precisos dados? Muito bem.
A Província de Trás-os-Montes e Alto Douro tem 2 distritos, Vila Real e Bragança. Trás-os-Montes e Alto Douro tem, portanto, cerca de 400.000 habitantes, mais ou menos. A Província de Ourense tem à volta de 345.000 habitantes. Pode comparar-se assim? Penso que assim se pode.
A província de Trás-os-Montes e Alto Douro tem uma área de 11.000 Km2, enquanto a de Ourense tem, por alto, 7.300 Km2. Pode comparar-se: as pobrezas comparam-se em todas as dimensões.
Em Trás-os-Montes e Alto Douro é como se sabe. Posso fazer um desenho um dia destes, mas por hoje passo. Vamos à Província de Ourense, à Galiza interior. Vamos?
Bom. A Província de Ourense tem 92 concelhos. Vão de Avion a A Peroxa, Monterrá a Maside, Verin a O Barco de Valdeoros, de Ourense a Castrelo de Miño. São 92 concelhos. O curioso é que tirando Ourense (110.000 habitantes), o resto são pequenos povos. Tirando Verín (13.500), Barco de Valdeorras (13.300), O Carballiño (12.800) e, vá lá, Xinzo de Limia (10.000), o resto tem entre 600 e 4000 almas viventes. A Teixeira tem, mesmo, só 569 pessoas, sendo de referir que os concelhos de O Bolo e de A Bola, juntos, perfazem 2900 seres humanos. É assim, não vale a pena inventar.
Ora bem. Então e nestes 92 concelhos quantos Centros de Saúde há? Há 110. Porquê? Porque sim. Porque há 14 concelhos que têm mais que um. Ourense tem 5. E Castrelo de Miño, por exemplo, tem 3. Palavra de honra: tem 3, e tem 2095 habitantes. Deve ser, talvez, terra de pouca gente e muito ancha, não?
Desses Centros de Saúde, 15 têm Serviços de Urgências permanentes. Falo de Ourense, de Verín, mas também de Viana de Bolo, Xinzo de Limia, O Carballiño, O Barco de Valdeorras, Bande, Ribadavia, são 15. Ribadavia tem 5500 habitantes, por exemplo.
Os Centros de Saúde que não têm urgência "drenam" (detesto esta palavra, mas, como disse, não me pagam para escrever - quanto mais para escrever bem), num critério que não é outro senão o da proximidade, para o Centro de Saúde - com urgência - mais próximo.
Os Centros de Saúde com Urgência permanente têm, em mais de 60% dos casos, além de clínicos gerais (habilitados a fazer suporte básico de vida, que é fundamental pelos motivos que se prendem com aquela parte de o coração bater e de a gente respirar), pediatras, e enfermeiras de Obstretrícia. Em 25% deles há dentistas - cá, nem nos hospitais. Há Fisioterapia, em cerca de 10% dos Centros.
Nesses 110 Centros de Saúde trabalham, ao todo, salvo óbitos recentes ou intervenções externas de Correia de Campos, 275 médicos generalistas, 45 pediatras, 15 dentistas, um porradão de enfermeiras e enfermeiros, variadíssimos técnicos, assistentes sociais. Muitos desses Centros têm possibilidade de fazer análises clínicas e radiografias.
Ora bom, encurtando distâncias que ainda tenho de ir mandar um e-mail ao Paulo Bento: além destes Centros de Saúde, a Província de Ourense tem que mais?
E agora uma pausa educativa. Escutei assim uma pergunta, há bocadinho: "isso de Verín, com 13.000 habitantes, é preciso ver até que ponto vai o quase...".
Vai até aqui: 80 camas, 42 médicos, Medicina Interna, Cirurgia, Anestesiologia, Reanimação, Dermatologia, Unidade de Dor, Fisioterapia, Otorrino, Oftalmologia, Urologia, Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria, Psiquiatria... por aí fora. A Régua, a cidade, tem 11.000 habitantes. E não tem quase nada.
Os cuidados de saúde são como o resto. Devem relacionar-se entre si da mesma maneira que se relacionam as pessoas: ou há relações - e têm de ser próximas, daí a importância dos lugares, porque os lugares são as pessoas em espaços pequenos, médios, do tamanho que tiverem - ou não as há e, nesse caso, que se foda a Bwin Liga.
Se é assim na Galiza Pobre, pensem como será na Galiza Rica. Na Catalunha, na Comunitat Valenciana, no País Basco, na Andaluzia, no caralho!
Repito: pode haver coisas boas nos lugares e haver, na mesma, estradas que nos transportem entre lugares.
Ao que o Maradona respondeu assim:
Deixando os particulares de lado, que com esperteza aqui esperteza ali toda a gente se consegue safar do que quer que seja (mais ou menos como fazer uma cassete para vender um jogador, com a excepção do romagnoli, que só se conseguirá vender apresentando um conjunto de fotografias pela lebowitz - nota: não estou a dizer que o besugo se tentou safar, estou a afirmar que eu me conseguiria safar dos pedacinhos mais levanta estádios do texto do besugo), os números queriam apenas dizer - e eu queria dizer apenas isso, por isso até me dei ao trabalho de só fazer contas de cabeça - que os aglomerados urbanos são maiores ali para os lados da Galiza do que para os lados de Trás-os-montes.
Eu não sei isso porque estudei (ninguém me pode acusar disso) mas porque é uma tendência que me disseram que há: país mais rico e eficiente, populações mais concentradas. Por isso Ourense produziu uma capital de 110 mil habitantes e Trás-os-montes produziu uma capital (digamos assim) de 50 mil habitantes. Era só isso. Este padrão repete-se quer no sentido ascendente da escala quer no sentido descendente, uma situação que traz dificuldades que não deviam ser esquecidas.
O besugo terá reparado que, aliado a isto, a Espanha é muito mais rica que Portugal (mais empresas e o caralho: só na galiza: pescanova e a zara e essas merdas). E não só: há ainda a particularidade de a Galiza ser uma provinvia autonómica de Madrid, que é quase tão bom como ser a Região Autónoma da Madeira de Lisboa. Será natural, portanto, que uma pessoa viva pior que os espanhois ali de Ourense. Viver pior quer dizer, por exemplo, também ter piores cuidados de saúde. Tudo o resto sendo igual (que não é, como defendo mais à frente), o que se segue, por muito que se martele, é também e em parte uma diferença de dinheiro:
Os Centros de Saúde com Urgência permanente têm, em mais de 60% dos casos, além de clínicos gerais (habilitados a fazer suporte básico de vida, que é fundamental pelos motivos que se prendem com aquela parte de o coração bater e de a gente respirar), pediatras, e enfermeiras de Obstretrícia. Em 25% deles há dentistas - cá, nem nos hospitais. Há Fisioterapia, em cerca de 10% dos Centros.
Nesses 110 Centros de Saúde trabalham, ao todo, salvo óbitos recentes ou intervenções externas de Correia de Campos, 275 médicos generalistas, 45 pediatras, 15 dentistas, um porradão de enfermeiras e enfermeiros, variadíssimos técnicos, assistentes sociais. Muitos desses Centros têm possibilidade de fazer análises clínicas e radiografias.
Sem querer parecer o Pacheco Pereira e ultrapassando a questão do volume de dinheiro das pessoas e do país, a questão que interessará explorar não será, portanto, a comparação directa entre número de centros de saúde e disponibilidades humanas e tecnologicas do hospital de Ourense e Vila real (que é uma adição, operação que até o Macário Correia fez em Tavira), mas uma coisa mais simples e muitíssimo mais complicada (mesmo para mim): como utilizar o que há (e que é, nem mais nem menos, o que há) de forma o mais espectacular possivel (que é uma operação distributiva, a que vulgarmente se dá o nome de administração pública).
É aqui que eu sempre quis chegar. Concordo com tudo: as estradas são menos imporantes que a saúde. Foda-se, mas eu disse outra coisa? A educação, a justiça, mesmo os centros de estágio, são menos importantes que a saúde, disse alguma coisa que contrariasse isto?
Mas a verdade é que Portugal não gasta menos em saúde que a Espanha. Gasta mais. Se gasta mais, e mesmo considerando que somos menos ricos, há razão para a diferença de quantidade de centros de saúde e de dentistas e e de máquinas com luzinhas e essas merdas entre Ourense e trás-os-montes?
É, como sempre, um problema de eficiência, que deriva, no meu entender (enfim), da cobardia dos politicos perante a natural resistência à mudança do portugues. Foda-se, eu não sei se o Correia de Campos é bom ou mau. Aliás, é unânime que na educação e na saúde nunca houve um bom ministro. O que eu tenho é uma sensação louca de que isto, com pouco esforço e um bocadinho de peito, poderia estar muito melhor.
Parte da minha familia é de Alcoutim, o concelho mais pobre de Portugal. Em 1960 Alcoutim tinha 10 mil habitantes. Hoje tem, salvo erro, 3 mil. As pessoas não desapareceram, foram para Faro, como fez a minha familia (demoraram 3 dias).
Faro tinha, em 1960, 35 mil habitantes; agora tem 60 mil. Esta merda não exigiu que se mudassem medicos de Alcoutim para Faro? Por acaso não, porque o que se fez foi produzir mais médicos. Mas Portugal só tem um bocadinho de menos médicos por mil habitantes que a espanha, e mais que a Inglaterra, que o Luxemburgo e o Japão. Porque é que há gajos nas avenidas novas sem médico de familia e terras sem serviços de saúde em trás os montes? O que é que se passa aqui?
Eu não sei o que é que se passa aqui. Tenho a certeza é que o país muda, muda, muda e muda mais; estou até convencido que o país pode embracar todo amanhã para a Republica Centro Africana, mas o caralho dos serviços publicos ficariam cá a garantir que nada feche e que, claro está, nada abra.
Não tenho nenhum conhecimento concreto das razões técnicas que levaram aos recentes fechos de estabeleciemntos de saúde em Trás-os-montes e noutros sitios. Mas, na minha irresponsabilidade, fico muito contente por ver um político a provocar protestos, revoltas e escândalo. Pena que sem cargas policiais, mas não se pode ter tudo.
E pronto, era isto. Como vê, besugo, eu não discordo de si. Eu tenho é mais tempo para estar aqui que você. 700 quadradinhos em branco para preencher numa folha excel não fazem barulho à porta do escritório.
PS: peço desculpa por não ter conseguido recuperar o texto que me valeu a gloria. estou um bocadinho farto das hortensias e estava a tentar substitui-las por qualquer outra coisa e vai daí aquilo desapareceu tudo. vidas.
PS - Correia de Campos tem razão na questão das urgências. Os problemas que decorrem de serviços médicos de má qualidade não fazem manchetes nos jornais e Portugal é o país do parolo que passa fome para ter um BMW estacionado à porta de casa (leia-se SAP aberto para ninguém lá ir ou para os que lá vão serem reencaminhados para o local onde deveriam ter ido inicialmente). No entanto, há aqui uma questão de fundo: o fecho de SAPs, verdadeiras e falsas urgências não pode ser feito sem um movimento que acautele os novos fluxos de doentes que previsivelmente existirão (veja-se o caso do Hospital de Aveiro, à volta do qual fecharão 5 urgências nocturnas). CC tentou fazer isso com base no programa de reforma da rede de urgências. Na minha opinião é aqui que está o problema: o relatório que deu origem a este processo não parece ter sido bem feito e seguramente falhou nas previsões de evolução da procura (pelo menos no caótico Hospital de Aveiro). Há uma outra questão que afecta o outcome de tudo isto e que na minha opinião é a mais importante: em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão. Espanha faz o que faz porque o Estado espanhol tem superavit e não défice e em Espanha há médicos a mais. Portugal e o SNS não têm nem dinheiro nem médicos. E quem não tem dinheiro não pode ter vícios (a abertura nocturna de serviços médicos que estão às moscas é um luxo que não pode ser tolerável num país como o nosso). Apesar de tudo prefiro a clareza: em concelhos como Estarreja não existe um verdadeiro serviço de urgência nocturna, pelo que o que vai fechar é outra coisa qualquer. E inteligentemente os políticos locais (num processo liderado pela AM) conseguiram trocar uma mão cheia de nada por um enorme pacote de benefícios para o hospital local. No fim das contas, a população não perde nada de noite e ganha muito de dia. E é assim que provavelmente vai acontecer em toda a parte. Hospitais XPTO como na Galiza? Esperemos pelo petróleo das Berlengas.Etiquetas: Política de Saúde, Política Estarrejense