sexta-feira, fevereiro 01, 2008
Eu, analista político frustrado, me confesso
Foi de facto com enorme espanto que vi CC sair do governo. Não fazia nenhum sentido à luz do que se conhecia do próprio (homem que não precisa de ser popular para andar satisfeito, que gosta da polémica e não tem medo da contestação de rua, habituado a dar a cara em situações difíceis e até com uma coragem física assinalável, que inclusive demonstrou em algumas ocasiões), nem à luz da imagem que Sócrates passava de si próprio (político determinado, insensível a pressões externas, leal aos seus, reformista com coragem para fazer "o que é preciso", resistente a lobbies e outras forças de pressão, etc.).
Na verdade, CC era uma espécie de âncora da imagem reformista e ousada do governo. Enquanto ministros como Mário Lino eram impopulares por defenderem projectos que todos achavam estar errados e consideravam desnecessários, CC devia a sua impopularidade a iniciativas que todos sabiam ser necessárias e que a maioria das pessoas até reconhecia que estavam correctas. Ou seja, ao contrário de outros, CC era um ministro que gozava de uma espécie de impopularidade credível e era visto como um mal necessário, uma espécie de álcool etílico que arde, mas é necessário para curar a ferida, mas que, podendo escolher, todos perferiríamos ver despejado por cima das crostas do vizinho do lado.
Perante isto, e reconhecendo a enorme habilidade política de José Sócrates, nunca pensei que CC pudesse cair, até porque a sua impopularidade era quase toda virtual e não suficientemente importante para mudar o sentido de voto das populações. Aliás, embora a Saúde seja uma área de importância fundamental e sempre geradora de enormes polémicas, penso que não haverá memória de um único governo que não tenha sido reeleito devido a opções tomadas na área da Saúde (veja-se o exemplo de Cavaco Silva, que teve maiorias absolutas mesmo com Leonor Beleza na Saúde).
No entanto, e porque no fim do jogo os prognósticos são sempre muito mais acertados, agora percebe-se com razoável clareza porque é que CC caiu: Sócrates apercebeu-se de que a contestação popular na área da Saúde estava a ser utilizada pela imprensa para a criação de casos artificiais, com um efeito de bola de neve em tudo semelhante ao que em 2004 fez cair Santana. O telefonema do bombeiro de Favaios, que em circunstâncias normais serviria para passar como apontamento cómico no final dos telejornais transformou-se em assunto de Estado e mereceu honras de destaque em todas as televisões e rádios. E Sócrates, começando a sentir-se chamuscado, não quis arriscar. A permanência de CC no governo poderia estar a custar demasiados votos ao PS e por outro lado as políticas impopulares estavam em contra-ciclo com o que se pretendia para a segunda parte do mandato, naturalmente programada para acabar em ascensão e com um final feliz nas urnas de 2009.
E foi assim. Entre os custos de perder a face e os custos de ter no governo o alvo de toda a especulação jornalística, Sócrates optou pelos primeiros.
Na minha opinião, e analisando o assunto segundo a mera lógica da aritmética eleitoral, Sócrates fez mal. É que a face de um político só se perde uma vez por legislatura. E Sócrates, depois do caso da licenciatura, nunca poderia ter demonstrado que é humano, convencível, vulnerável e que cede a pressões (da comunicação social, dos bombeiros de Alijó ou das velhinhas de Anadia). A partir de agora, nada será como antes. É sempre possível argumentar que agora também não é preciso, pois já estamos em plena campanha eleitoral para 2009 e daqui para a frente vamos ter só flores. A mim não me parece que isso seja possível e acho sinceramente que Sócrates ainda há-de ter saudades do medo que antes causava ao eleitorado.
Uma coisa é certa: a história deste governo será sempre dividida em duas fases - o período CC e a época pós-CC. E parece pouco provável que esta interrupção traga algum benefício ao SNS, ao país ou até ao próprio PS.
Foi de facto com enorme espanto que vi CC sair do governo. Não fazia nenhum sentido à luz do que se conhecia do próprio (homem que não precisa de ser popular para andar satisfeito, que gosta da polémica e não tem medo da contestação de rua, habituado a dar a cara em situações difíceis e até com uma coragem física assinalável, que inclusive demonstrou em algumas ocasiões), nem à luz da imagem que Sócrates passava de si próprio (político determinado, insensível a pressões externas, leal aos seus, reformista com coragem para fazer "o que é preciso", resistente a lobbies e outras forças de pressão, etc.).
Na verdade, CC era uma espécie de âncora da imagem reformista e ousada do governo. Enquanto ministros como Mário Lino eram impopulares por defenderem projectos que todos achavam estar errados e consideravam desnecessários, CC devia a sua impopularidade a iniciativas que todos sabiam ser necessárias e que a maioria das pessoas até reconhecia que estavam correctas. Ou seja, ao contrário de outros, CC era um ministro que gozava de uma espécie de impopularidade credível e era visto como um mal necessário, uma espécie de álcool etílico que arde, mas é necessário para curar a ferida, mas que, podendo escolher, todos perferiríamos ver despejado por cima das crostas do vizinho do lado.
Perante isto, e reconhecendo a enorme habilidade política de José Sócrates, nunca pensei que CC pudesse cair, até porque a sua impopularidade era quase toda virtual e não suficientemente importante para mudar o sentido de voto das populações. Aliás, embora a Saúde seja uma área de importância fundamental e sempre geradora de enormes polémicas, penso que não haverá memória de um único governo que não tenha sido reeleito devido a opções tomadas na área da Saúde (veja-se o exemplo de Cavaco Silva, que teve maiorias absolutas mesmo com Leonor Beleza na Saúde).
No entanto, e porque no fim do jogo os prognósticos são sempre muito mais acertados, agora percebe-se com razoável clareza porque é que CC caiu: Sócrates apercebeu-se de que a contestação popular na área da Saúde estava a ser utilizada pela imprensa para a criação de casos artificiais, com um efeito de bola de neve em tudo semelhante ao que em 2004 fez cair Santana. O telefonema do bombeiro de Favaios, que em circunstâncias normais serviria para passar como apontamento cómico no final dos telejornais transformou-se em assunto de Estado e mereceu honras de destaque em todas as televisões e rádios. E Sócrates, começando a sentir-se chamuscado, não quis arriscar. A permanência de CC no governo poderia estar a custar demasiados votos ao PS e por outro lado as políticas impopulares estavam em contra-ciclo com o que se pretendia para a segunda parte do mandato, naturalmente programada para acabar em ascensão e com um final feliz nas urnas de 2009.
E foi assim. Entre os custos de perder a face e os custos de ter no governo o alvo de toda a especulação jornalística, Sócrates optou pelos primeiros.
Na minha opinião, e analisando o assunto segundo a mera lógica da aritmética eleitoral, Sócrates fez mal. É que a face de um político só se perde uma vez por legislatura. E Sócrates, depois do caso da licenciatura, nunca poderia ter demonstrado que é humano, convencível, vulnerável e que cede a pressões (da comunicação social, dos bombeiros de Alijó ou das velhinhas de Anadia). A partir de agora, nada será como antes. É sempre possível argumentar que agora também não é preciso, pois já estamos em plena campanha eleitoral para 2009 e daqui para a frente vamos ter só flores. A mim não me parece que isso seja possível e acho sinceramente que Sócrates ainda há-de ter saudades do medo que antes causava ao eleitorado.
Uma coisa é certa: a história deste governo será sempre dividida em duas fases - o período CC e a época pós-CC. E parece pouco provável que esta interrupção traga algum benefício ao SNS, ao país ou até ao próprio PS.
Etiquetas: Política de Saúde, Política Nacional
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