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terça-feira, novembro 15, 2011

O Prós e Contras de ontem (que só consegui ver parcialmente) foi um penoso exercício de auto-flagelação. O bastonário da Ordem dos Médicos (BOM) expôs-se numa guerra que não poderia ganhar e da qual só poderia sair ferido. Mostrou falta de solidez científica, alguma desonestidade intelectual e não conseguiu descolar da imagem de associação aos interesses da indústria farmacêutica (IF). O bastonário da Ordem dos Farmacêuticos (BOF) aproveitou o tempo de antena para reivindicar uma medida que quando for aplicada será economicamente ruinosa para as farmácias, mostrou falta de urbanidade na forma pouco educada como conduziu o debate e reduziu os farmacêuticos, mais uma vez, a um grupo de profissionais essencialmente orientados para o lucro (pois todos sabem que os genéricos proporcionam margens muito superiores às dos restantes medicamentos - e a possibilidade de escolher o genérico ainda aumenta mais essa possibilidade).
No fundo, o BOM e o BOF perderam uma excelente oportunidade para estarem calados. Aliás, basta um olhar rápido pelo Facebook do Prós e Contras para perceber que, com a excepção dos comentários clubísticos, há um sentimento quase unânime de reprovação do triste espectáculo de ontem.
Ainda está para chegar o primeiro debate sobre genéricos que não me deixa irritado. Há apenas uma questão de base e à qual ainda ninguém me deu uma boa resposta: faz algum sentido exigirmos à IF níveis de rigor e modernização tecnológica elevadíssimos para no final dizermos que uma variação de 80% a 125% é perfeitamente aceitável e clinicamente irrelevante? Mesmo que o seja, não faz.

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quarta-feira, novembro 02, 2011

Há duas soluções possíveis para o problema grego:

  1. Agarrar em Papandreou pelo pescoço e obrigá-lo a aceitar o acordo (o que já está a ser feito e vai ser tentado hoje de uma forma mais efectiva);
  2. Deixar a Grécia convoque o referendo e fazer com que este fique outdated, isto é, propor um novo acordo antes da realização do referendo, eliminando a proposta anterior e deixando os gregos com uma votação que não faz sentido - esta é a solução que Papandreou prefere.
Haverá ainda uma terceira via, que passaria por deixar falir a Grécia e blindar o resto da zona Euro a eventuais problemas semelhantes. No entanto, isto não poderia ser feito sem uma garantia ilimitada por parte do BCE, cenário que até agora tem sido sempre excluído por Merkel.
De qualquer modo, continua a ser altamente improvável a realização do referendo... vamos a ver o que sai hoje de Cannes. 
Ainda assim, não devemos desprezar o facto da Grécia ser hoje um barril de pólvora, com forças armadas de potencial nada negligenciável e com condições sociais mais que propícias à queda do regime - Papandreou jogou uma cartada arriscada e aparentemente inteligente (tentar forçar um acordo mais favorável ou passar a responsabilidade para o povo) e só o fez depois de garantir que os militares não causariam problemas. No dia 24 de Abril de 1974 haveria em Portugal muita gente que concordaria com este tipo de estratégia. Hoje sabemos que isto é um caminho muito arriscado e de consequências potencialmente imprevisíveis - e o maior risco para a Europa não é Papandreou, mas quem o possa substituir num cenário de ruptura.

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terça-feira, novembro 01, 2011

O referendo que nunca se realizará

Passada a estupefacção inicial (que partilho com o resto do mundo económico), há que perceber o que é que se passa no epicentro da crise económica mundial e porque é que Papandreou decidiu jogar a cartada do referendo (que nunca se irá realizar, aposto com quem quiser - ou se acontecer e decidir em sentido contrário ao do acordo será rapidamente seguido por referendos sucessivos até que um destes aprove o que o resto do mundo quer). A situação é bastante complexa e resume-se mais ou menos assim:
- Em primeiro lugar, já se percebeu que o acordo conseguido na semana passada não é ainda a solução final para o problema, mas antes mais uma etapa intercalar neste interminável adiar da intervenção do BCE que Merkel impõe a todo o custo. De facto, o reforçado FEEF continua a não ser suficiente para resgatar Itália e Espanha (os clientes que se seguem), para além de que com este acordo a falência da Grécia não está ainda completamente fora de hipótese. Sintoma disso é o facto das taxas de juro da dívida italiana e espanhola já terem voltado a subir (especialmente a primeira), sendo o facto de Merkel não ter sob Berlusconi o mesmo tipo de capacidade de pressão que tem sobre Portugal, Grécia e Irlanda uma preocupação adicional. Além disso, um dos eixos do FEEF (a França) está a fraquejar, o que torna a situação ainda mais complexa. Em resumo, o acordo da semana passada serviu para ganhar tempo, mas apenas isso - embora não seja de descurar a capacidade regeneradora do tempo, especialmente na Economia;
- Em segundo lugar, Papandreou já não tem nada a perder: não vai ser reeleito PM e as coisas não podem piorar para a Grécia. De facto, a zona Euro já percebeu que um default grego teria consequências sistémicas imprevisíveis, com os credit default swaps a disseminarem o problema de um modo absolutamente descontrolado por todas as economias do mundo, pelo que o definhar em banho-maria é absolutamente inevitável. O perdão de 50% (ou mais, vamos ver em que ficamos) da dívida é, isso sim, uma garantia de recuperação de 50% de um crédito muitíssimo malparado, de cobrança quase impossível, pelo que interessa muito mais aos credores que aos devedores. Ou seja, esta é uma win-win situation para Papandreou: ou há referendo e a responsabilidade pelo que se passar é transferida para o povo, ou não há referendo e ninguém o pode acusar de não ter tentado. Havendo referendo e ganhando o "sim" foi o povo que quis, enquanto que se ganhar o "não" a Europa terá inevitavelmente que apresentar outra proposta à Grécia - e Papandreou sairá reforçado aos olhos dos seus eleitores.

Falta sentido de Estado, qualidade técnica e capacidade política aos actuais líderes europeus. O fim desta crise chegará quando o BCE fizer o mesmo que o Fed fez (discretamente e sem levantar ondas) em 2008 e garantir, sem qualquer limite, a dívida pública dos Estados da zona Euro. No actual clima económico os riscos de inflação seriam muito reduzidos e mesmo para a Alemanha esta é, de longe, a melhor opção. Infelizmente teremos que esperar pela entrada da Alemanha em recessão para que os seus obtusos governantes o percebam.

Paradoxalmente, é neste momento cada vez mais evidente que esta crise é desnecessária: embora lentamente e em múltiplas etapas e pacotes, todos já perceberam que a Grécia não vai falir, pois é mais caro deixá-la cair do que que salvá-la. Sendo assim, para quê tanta turbulência?

PS - O referendo grego não tem nada a ver com democracia, como alguns clamam pela blogosfera. É, aliás, o contrário da democracia - o povo elegeu Papandreou, logo é este quem deve governar. Entalar o povo com questões de resposta impossível e das quais sairá sempre a perder é destruir a confiança e capacidade de decisão dos eleitores - e é quando as pessoas deixam de acreditar que as democracias morrem e surgem as condições para as ditaduras poderem aparecer.


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