segunda-feira, novembro 26, 2007
O Maltizers comentou assim este post:
Olá Vladimiro.
Adorei a tua intervenção na conferência.
Assim como adorei, devo dizê-lo, a intervenção do "mestre" Pita Barros.
Adorei ambas, não porque concorde com tudo o que nelas foi dito, mas porque se trataram, sem dúvida, de exposições assertivas e cativantes em que ambos expuseram os seus argumentos de forma muito honesta.
Sou farmacêutico, queria tender mais para o lado do Vladimiro, mas o facto é que, apesar de ter simpatizado mais com a sua perspectiva farmacêutica, fui igualmente sensível à visão economista do Prof. PPB.
A minha conclusão muito pessoal disto tudo é que caberia, tal como coube efectivamente, ao poder político, fazer a análise minuciosa e o balanço destas e doutras perspectivas e tomar as decisões em conformidade. O grande pecado deste governo foi não o ter feito. Acredito que o Ministro da Saúde e a sua equipa sejam muito dotados e competentes. Não duvido. Mas a forma como têm conduzido certos processos, tal como este, desencadeado por motivos quase que "passionais" (refiro-me à questiúncula Cordeiro vs. Campos), é realmente caricata. Não me interessa o benefício dos farmacêuticos. Interessa-me o benefício das populações. O que acredito é que as populações são e seriam mais beneficiadas se a propriedade se mantivesse exclusiva de farmacêuticos e indissociável da direcção-técnica. Mas isso é uma crença, não é, objectivamente, como referiu PPB, uma constatação científica. Tal como não o é certamente, e com o devido respeito, o contrário. Por isso o busílis nesta questão foi e é só um e o governo preferiu resolvê-lo pelo lado mais "escuro" (aludindo ao "salto no escuro" referido pelos intervenientes na sessão organizada pela OF-Centro).
Quanto à liberalização da abertura, caro Vladimiro, não entendo porque dizes que comprometeria a equidade de serviço às populações. A disposição, no novo regime jurídico das farmácias, que permite a transferência de qualquer farmácia, das freguesias mais díspares e distantes de um concelho, para o centro do município, não compromete também essa equidade de que falas? Penso que compromete na mesma medida que um liberalização de abertura o comprometeria. Ao sair uma farmácia de uma aldeia para abrir na cidade, logo aparecerá alguém, nem que seja um jovem farmacêutico disposto a fazer disso o seu projecto de vida, a abrir nesse local que ficou vago. Não vejo problema de maior aí. Tal como está este novo regime juríco das farmácias, suspeito que uma alteração ao estatuto legar da abertura das farmácias não viria a alterar significativamente a realidade. É esperar para ver...Porque, tal como o PPB disse, aqui ninguém é vidente e nem sequer nos podemos fiar nos economistas para isso...:)
Sobre o mesmo tema, o Pedro Mazzoni comentou assim:
Boa tarde Vladimiro,
Eu entendi a orientação do debate, a questão é que também penso que seja um pouco de arrogância a posição sobre a propriedade. Se tiveres como exemplo a produção de medicamentos, uma empresa como a pfizer tem milhares de accionistas, sendo que os principais não(ou muito dificilmente) terão outro objectivo que não o lucro. E é nessa procura de lucro que servem as necessidades das pessoas (a velha questão da mão invisível). Se aplicasses o mesmo critério, quem poderia ser dono de um laboratório? Saberás melhor do que eu que existe algum poder por parte dos farmacêuticos nas empresas grossistas (alguns quadros superiores e intermédios das principais empresas de distribuição têm ligações indirectas, quando não são mesmo directas com proprietários de farmácias) por isso também não entendo a questão do receio da integração vertical do negócio.A questão do espancamento era puramente jocoso.
Penso que é um pouco difícil falar da propriedade sem ao mesmo tempo abordar a questão da instalação. Porque nesse caso, a liberalização de propriedade apenas levaria à transferência do excedente do produtor (farmacêutico) para outro indivíduo (não farmacêutico). Mas é um sector tão regulado e na minha perspectiva, regulação é sinónimo de protecção económica e favorecimento (quase sempre).
Em relação à questão da propriedade das farmácias (que é um problema póstumo, uma vez que me parece politicamente pouco provável a anulação desta lei), a principal questão são os incentivos que se criam. Como eu e PPB demonstrámos na conferência, uma farmácia é simultaneamente um estabelecimento de saúde e um negócio. E, como tal, a sua gestão envolve aspectos e preocupações relacionados com a Saúde Pública e também, como acontece com qualquer empresa, aspectos económicos e de gestão. Ora, até agora os farmacêuticos provaram que de um modo geral têm conseguido equilibrar as coisas: as farmácias são estabelecimentos de saúde de reconhecida qualidade, a farmácia portuguesa está entre as melhores do mundo e apresentam graus de satisfação da ordem dos 95%. Em relação aos novos empresários que vão entrar no sector, embora não saibamos o modo como estes se vão comportar, sabemos pelo menos que o sistema tal como ele está montado constitui um incentivo à má prática: a abertura da propriedade sem liberalização da instalação fará inevitavelmente subir os preços das farmácias. E esta subida de preços constitui um incentivo a medidas de gestão mais apertadas e ao corte de alguns serviços. Ou seja, é disto que aqui se trata: incentivos. E o novo sistema tem claramente incentivos piores que o anterior.
Em relação à liberalização da instalação, há um dado que é importante reter: nos países em que a instalação é liberal há menos farmácias por habitante que nos países em que a instalação ocorre por concurso público. E a distribuição dessas farmácias é assimétrica (e geradora de inequidades), com concentração nos grandes centros urbanos e abandono das farmácias de província (que deixam de ser rentáveis e acabam por fechar).
Quanto ao exemplo da Pfizer, é curioso que o Pedro Mazzoni o tenha referido, pois trata-se da empresa que gerou um dos melhores exemplos internacionais de inequidade: no Reino Unido, só as farmácias da Boots é que vendem produtos da Pfizer. Transpondo este caso para Portugal, se a Boots não considerasse que Bragança é um local rentável para ter uma farmácia, os habitantes dessa cidade não poderiam comprar, por exemplo, o velho e bom Viagra... :)
Deste modo, sou a favor de uma diminuição da capitação para valores próximos dos 2000 habitantes por farmácia (que aliás já estão em vigor em alguns distritos de Portugal), mas mantendo a reserva da propriedade para farmacêuticos e a figura do concurso público.
Muito obrigado a ambos os comentadores pela participação neste blogue e pelas palavras que me dirigem:)
Olá Vladimiro.
Adorei a tua intervenção na conferência.
Assim como adorei, devo dizê-lo, a intervenção do "mestre" Pita Barros.
Adorei ambas, não porque concorde com tudo o que nelas foi dito, mas porque se trataram, sem dúvida, de exposições assertivas e cativantes em que ambos expuseram os seus argumentos de forma muito honesta.
Sou farmacêutico, queria tender mais para o lado do Vladimiro, mas o facto é que, apesar de ter simpatizado mais com a sua perspectiva farmacêutica, fui igualmente sensível à visão economista do Prof. PPB.
A minha conclusão muito pessoal disto tudo é que caberia, tal como coube efectivamente, ao poder político, fazer a análise minuciosa e o balanço destas e doutras perspectivas e tomar as decisões em conformidade. O grande pecado deste governo foi não o ter feito. Acredito que o Ministro da Saúde e a sua equipa sejam muito dotados e competentes. Não duvido. Mas a forma como têm conduzido certos processos, tal como este, desencadeado por motivos quase que "passionais" (refiro-me à questiúncula Cordeiro vs. Campos), é realmente caricata. Não me interessa o benefício dos farmacêuticos. Interessa-me o benefício das populações. O que acredito é que as populações são e seriam mais beneficiadas se a propriedade se mantivesse exclusiva de farmacêuticos e indissociável da direcção-técnica. Mas isso é uma crença, não é, objectivamente, como referiu PPB, uma constatação científica. Tal como não o é certamente, e com o devido respeito, o contrário. Por isso o busílis nesta questão foi e é só um e o governo preferiu resolvê-lo pelo lado mais "escuro" (aludindo ao "salto no escuro" referido pelos intervenientes na sessão organizada pela OF-Centro).
Quanto à liberalização da abertura, caro Vladimiro, não entendo porque dizes que comprometeria a equidade de serviço às populações. A disposição, no novo regime jurídico das farmácias, que permite a transferência de qualquer farmácia, das freguesias mais díspares e distantes de um concelho, para o centro do município, não compromete também essa equidade de que falas? Penso que compromete na mesma medida que um liberalização de abertura o comprometeria. Ao sair uma farmácia de uma aldeia para abrir na cidade, logo aparecerá alguém, nem que seja um jovem farmacêutico disposto a fazer disso o seu projecto de vida, a abrir nesse local que ficou vago. Não vejo problema de maior aí. Tal como está este novo regime juríco das farmácias, suspeito que uma alteração ao estatuto legar da abertura das farmácias não viria a alterar significativamente a realidade. É esperar para ver...Porque, tal como o PPB disse, aqui ninguém é vidente e nem sequer nos podemos fiar nos economistas para isso...:)
Sobre o mesmo tema, o Pedro Mazzoni comentou assim:
Boa tarde Vladimiro,
Eu entendi a orientação do debate, a questão é que também penso que seja um pouco de arrogância a posição sobre a propriedade. Se tiveres como exemplo a produção de medicamentos, uma empresa como a pfizer tem milhares de accionistas, sendo que os principais não(ou muito dificilmente) terão outro objectivo que não o lucro. E é nessa procura de lucro que servem as necessidades das pessoas (a velha questão da mão invisível). Se aplicasses o mesmo critério, quem poderia ser dono de um laboratório? Saberás melhor do que eu que existe algum poder por parte dos farmacêuticos nas empresas grossistas (alguns quadros superiores e intermédios das principais empresas de distribuição têm ligações indirectas, quando não são mesmo directas com proprietários de farmácias) por isso também não entendo a questão do receio da integração vertical do negócio.A questão do espancamento era puramente jocoso.
Penso que é um pouco difícil falar da propriedade sem ao mesmo tempo abordar a questão da instalação. Porque nesse caso, a liberalização de propriedade apenas levaria à transferência do excedente do produtor (farmacêutico) para outro indivíduo (não farmacêutico). Mas é um sector tão regulado e na minha perspectiva, regulação é sinónimo de protecção económica e favorecimento (quase sempre).
Em relação à questão da propriedade das farmácias (que é um problema póstumo, uma vez que me parece politicamente pouco provável a anulação desta lei), a principal questão são os incentivos que se criam. Como eu e PPB demonstrámos na conferência, uma farmácia é simultaneamente um estabelecimento de saúde e um negócio. E, como tal, a sua gestão envolve aspectos e preocupações relacionados com a Saúde Pública e também, como acontece com qualquer empresa, aspectos económicos e de gestão. Ora, até agora os farmacêuticos provaram que de um modo geral têm conseguido equilibrar as coisas: as farmácias são estabelecimentos de saúde de reconhecida qualidade, a farmácia portuguesa está entre as melhores do mundo e apresentam graus de satisfação da ordem dos 95%. Em relação aos novos empresários que vão entrar no sector, embora não saibamos o modo como estes se vão comportar, sabemos pelo menos que o sistema tal como ele está montado constitui um incentivo à má prática: a abertura da propriedade sem liberalização da instalação fará inevitavelmente subir os preços das farmácias. E esta subida de preços constitui um incentivo a medidas de gestão mais apertadas e ao corte de alguns serviços. Ou seja, é disto que aqui se trata: incentivos. E o novo sistema tem claramente incentivos piores que o anterior.
Em relação à liberalização da instalação, há um dado que é importante reter: nos países em que a instalação é liberal há menos farmácias por habitante que nos países em que a instalação ocorre por concurso público. E a distribuição dessas farmácias é assimétrica (e geradora de inequidades), com concentração nos grandes centros urbanos e abandono das farmácias de província (que deixam de ser rentáveis e acabam por fechar).
Quanto ao exemplo da Pfizer, é curioso que o Pedro Mazzoni o tenha referido, pois trata-se da empresa que gerou um dos melhores exemplos internacionais de inequidade: no Reino Unido, só as farmácias da Boots é que vendem produtos da Pfizer. Transpondo este caso para Portugal, se a Boots não considerasse que Bragança é um local rentável para ter uma farmácia, os habitantes dessa cidade não poderiam comprar, por exemplo, o velho e bom Viagra... :)
Deste modo, sou a favor de uma diminuição da capitação para valores próximos dos 2000 habitantes por farmácia (que aliás já estão em vigor em alguns distritos de Portugal), mas mantendo a reserva da propriedade para farmacêuticos e a figura do concurso público.
Muito obrigado a ambos os comentadores pela participação neste blogue e pelas palavras que me dirigem:)
Etiquetas: Farmácia, Política de Saúde
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